Muito antes de a humanidade inventar números, cálculos ou qualquer forma de escrita, pessoas que viveram no norte da Mesopotâmia já demonstravam um tipo intuitivo de raciocínio matemático. A conclusão vem da análise de vasos de cerâmica produzidos há mais de 8.000 anos, decorados com flores e plantas organizadas em padrões regulares. O estudo foi conduzido por pesquisadores da Universidade Hebraica de Jerusalém e publicado no Journal of World Prehistory.
Os objetos analisados pertencem à chamada cultura Halafiana, que se desenvolveu entre cerca de 6200 e 5500 a.C., em uma região que hoje abrange partes do Iraque, da Síria e da Turquia. À primeira vista, os vasos chamam atenção pela decoração delicada. Um exame mais atento, porém, revelou algo além da estética.
O que aparece nesses vasos antigos?
Os vasos não trazem números, símbolos ou cálculos. O que aparece são desenhos de flores, ramos e arbustos distribuídos de forma rigorosamente organizada ao longo da superfície da cerâmica. Em muitos casos, os pesquisadores identificaram flores com números fixos de pétalas, como quatro, oito, 16 ou 32, repetidas de maneira regular, formando sequências simétricas.
Essa organização indica que os artesãos planejavam a divisão do espaço antes de pintar, garantindo que os elementos fossem distribuídos de forma equilibrada ao redor do vaso.
Por que isso é considerado matemática?
Segundo os autores do estudo, esse tipo de organização visual exige noções básicas de proporção, repetição e simetria, que são princípios fundamentais do pensamento matemático. Ainda que não existissem números escritos, havia uma compreensão prática de como dividir um espaço em partes iguais e repetir padrões de maneira consistente.
Trata-se do que os pesquisadores chamam de pensamento matemático intuitivo: uma forma de raciocínio baseada na observação e na organização do mundo visual, e não em símbolos ou fórmulas.
Por que as plantas viraram tema da decoração?
Até esse período, a arte pré-histórica costumava retratar principalmente pessoas e animais. A cultura Halafiana marca um momento de mudança, ao incorporar plantas como tema recorrente. Curiosamente, os vasos não mostram plantas comestíveis nem elementos ligados diretamente à agricultura.
A escolha das flores pode estar ligada às suas formas naturalmente simétricas, que facilitam a criação de padrões visuais equilibrados. Para os pesquisadores, isso sugere que os desenhos tinham um papel mais cognitivo e estético do que prático ou ritual.
Registros escritos de matemática só apareceriam milhares de anos depois, na antiga Suméria. As cerâmicas analisadas indicam que o raciocínio matemático surgiu antes disso, como uma habilidade visual e espacial desenvolvida no cotidiano das primeiras comunidades agrícolas.
