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“Carro não é indispensável”, diz escritor e podcaster Paris Marx

Os carros autônomos ainda hoje são vendidos como solução contra o trânsito e acidentes, mas ainda não se firmaram. Que lição tirar dessa demora? O Vale do Silício não entende os verdadeiros desafios da mobilidade urbana. Essas tecnologias são pensadas para manter o modelo atual de transporte individual, que é lucrativo para as empresas, mas disfuncional para as cidades. Em vez de investir em sistemas coletivos, acessíveis e sustentáveis, gastam bilhões de dólares em promessas futuristas que não saem do chão — como os táxis aéreos que seriam usados na Olimpíada de Paris.

O carro, seja o que conhecemos hoje, a combustão ou elétrico, seja o veículo sem motorista, já não é fundamental? Seguimos presos à ideia de que o carro é indispensável. Não é. Ele moldou, é verdade, nosso imaginário sobre o que é ser livre e bem-sucedido. No século XX, o carro virou sinônimo de progresso individual, e muitas cidades foram literalmente desenhadas para ele — como Brasília, que privilegia o automóvel e dificulta a vida de quem anda a pé ou depende de transporte público. Isso gerou exclusão, congestionamento e emissões de poluentes.

Devemos, portanto, desdenhar de propostas como os eVTOLs, os chamados “carros voadores”, e outras ideias inovadoras? Essas propostas criam a ilusão de inovação, mas na prática evitam que enfrentemos mudanças estruturais. Em vez de melhorar o que já existe — como trens e ônibus —, preferem vender ideias mirabolantes que mantêm o foco no transporte privado. É um tipo de espetáculo tecnológico que distrai da necessidade de políticas públicas sérias.

O que fazer? Desconfiar das chamadas cidades inteligentes. Muitas vezes, elas são apenas plataformas para coleta de dados e vigilância, sob o pretexto de eficiência. Tecnologias são vendidas como neutras, mas reforçam desigualdades. O problema não é usar tecnologia, e sim colocá-la a serviço do bem-estar individual, e não coletivo. Precisamos pensar em cidades justas, não apenas inteligentes.

Há esperança? Sim — e ela vem de baixo. Movimentos por mobilidade ativa, cooperativas de entrega, cidades que investem em transporte público de qualidade são iniciativas locais, mas que mostram caminhos possíveis. O futuro não precisa ser distópico, como se costuma dizer.

Publicado em VEJA de 8 de agosto de 2025, edição nº 2956

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