O protesto do último domingo não se limitou à força numérica. Em São Paulo, na avenida Paulista, e no Rio, em Copacabana, multidões se reuniram para dizer não à anistia aos golpistas de 8 de janeiro e à chamada PEC da Blindagem. A presença de cerca de 42 mil pessoas em cada ato, segundo monitoramento do Cebrap, colocou os dois protestos em pé de igualdade com as manifestações bolsonaristas do 7 de setembro.
O mais importante que o empate em números tenha sido a disputa simbólica. A bandeira nacional, tantas vezes sequestrada por atos de direita nos últimos anos, reapareceu nos protestos como sinal de resistência democrática. Como observou um dos organizadores, “a bandeira é que mostrou quem ganhou” (até porque, a bandeirão dos EUA foi o maior erro da extrema direita nos últimos anos, em meio ao tarifaço trumpista).
Em Copacabana, reduto bolsonarista nos últimos anos, a surpresa foi ainda maior: ver milhares ocupando a praia, embalados por shows de Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Djavan e Maria Gadú, transformou o ato em um espetáculo de cultura e memória. O espírito de resistência ecoou também nos versos de Cazuza, relembrados no palco: “Grande pátria. Desimportante. Em nenhum instante eu vou te trair”.
Em palanques e carros de som, lideranças como Guilherme Boulos, Erika Hilton e Tabata Amaral criticaram a PEC que limita investigações contra parlamentares e contestaram a tentativa de anistia aos condenados pelo golpe. Em Brasília, cartazes chamavam a Câmara de “vergonha”. Em Belo Horizonte, faixas proclamavam “Sem Anistia” e “Congresso inimigo do povo”.
O presidente Lula também buscou capitalizar o momento. “As manifestações de hoje demonstram que a população não quer a impunidade, nem a anistia. O Congresso Nacional deve se concentrar em medidas que tragam benefícios para o povo brasileiro”, escreveu em suas redes, já a caminho dos Estados Unidos para a Assembleia da ONU.
Se até aqui a direita vinha pautando a rua, agora a esquerda mostrou que também tem capacidade de mobilização. Mais que um protesto, o domingo revelou uma disputa pelo significado da democracia, e até mesmo pelo direito de vestir as cores do país. O bandeirao verde e amarelo passou para as mãos da esquerda.