A Ata do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), divulgada nesta terça-feira, 16, mostra que a autoridade monetária do País segue com um tom duro. O comunicado do BC elevou as incertezas do mercado sobre quando o corte de juros deve começar: em março ou em algum momento no curto e médio prazo.
Segundo Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos, o BC reconheceu que a atividade econômica está arrefecendo conforme o esperado e que a inflação surpreendeu positivamente comparado ao que era esperado no início do ano.
”Em nossa avaliação, a ata indica a necessidade de manter a taxa Selic nos níveis atuais por mais tempo, de modo a reforçar o processo de desinflação em curso”, diz Megale. “O Comitê não parece inclinado a iniciar o ciclo de corte de juros em janeiro, apesar da melhora recente no cenário inflacionário”, afirma.
Segundo Rafael Sueishi, head de renda fixa da Manchester Investimentos, o tom acaba sendo mais firme quando destaca que a política monetária precisa permanecer restritiva por tempo bastante prolongado. Sueishi diz que a Ata estava sem espaço para “complacência”.
Nela, o Copom sinaliza que cortes de juros, quando ocorrerem, vão depender de evidências consistentes de convergência da inflação para a meta e não apenas de leituras pontuais mais benignas. “Em resumo, a ata consolida uma posição mais dura (hawkish), uma prudência elevada, foco absoluto na ancoragem das expectativas”, diz Sueishi.
Segundo Mario Mesquita, economista-chefe do Itaú BBA, o Copom observa sinais mistos da atividade econômica, como geralmente ocorre em pontos de inflexão, e um mercado de trabalho resiliente, o que exigirá mais tempo para avaliar adequadamente os componentes cíclicos versus estruturais.
Quando o Banco Central deve cortar juros?
A definição do corte de juros ficou incerta. Entre os especialistas consultados por VEJA, dois apontam para corte em março, enquanto um define um corte de juros no curto prazo e os outros dois não sabem quando o corte deve começar.
Ângelo Belitardo, gestor da Hike Capital, também reforça que o tom do BC foi duro, inclusive, em relação ao risco fiscal e ao afirmar explicitamente que o Copom não hesitará em retomar aumentos de juros se as condições assim exigirem, mantendo uma linguagem vigilante e cautelosa. “O Banco Central provavelmente não iniciará cortes imediatamente em janeiro de 2026, mas sim no primeiro trimestre de 2026, possivelmente em março”, estima Belitardo.
O gestor diz que essa tese é fundamentada no fato de que a ata reforça a necessidade de manter juros elevados por um período prolongado e em que a autoridade enfatiza vigilância contínua dos dados. “Isso sugere que o início da flexibilização será orientado por evidências concretas de redução de pressões inflacionárias e de um quadro econômico com brecha suficiente sem riscos para a ancoragem das expectativas”, diz Belitardo.
A Hike Capital estima que a Selic deve terminar 2026 cotada entre 11,75% a 12,50% ao ano, considerando um ciclo de cortes graduais ao longo do ano, aberto em um contexto de inflação convergente à meta e atividade econômica desacelerando. “Essa projeção incorpora a hipótese de cortes sequenciais de 0,25 ponto porcentual ao longo de várias reuniões”, diz Belitardo.
Para a XP Investimentos, o corte de juros também deve começar em março, com a Selic encerrando 2026 em 12,00% após seis cortes consecutivos de 0,50 ponto porcentual. “A economia mostra desaceleração, mas o comitê deixou claro que necessita de mais tempo e mais informações antes de iniciar um ciclo de flexibilização monetária”, diz Megale.
Ala mais pessimista não tem previsão para início do corte de juros
Já o Itaú BBA prefere não cravar quando o corte de juros deve começar. O banco disse que a /’barra ficou alta para um corte de juros em janeiro” após o tom duro desta terça-feira. No entanto, os especialistas enxergam que a Selic deve encerrar 2026 cotada a 12,75% ao ano. Ou seja, os cortes devem acontecer.
“O Copom descreve o cenário como prescrevendo uma política monetária contracionista, em vez de apenas estar em um patamar contracionista, o que deixa em aberto a possibilidade de um corte de juros no curto prazo”, diz Mesquita. Desse modo, Itaú BBA vê espaço para a queda da Selic no próximo ano, mas em menor intensidade que a XP e sem apontar quando a taxa deve cair.
Essa visão é semelhante a de Ricardo Rocha, colunista da Veja e coordenador de finanças do Insper, e Danilo Igliori, economista-chefe da Nomad. Em entrevista ao programa VEJA Mercado, ambos veem janeiro praticamente descartado e março cada vez mais incerto. Para Ricardo Rocha, o Copom segue pressionado por um ambiente de gastos públicos elevados e estímulos ao consumo.
Ele chama atenção para a isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil, já mencionada na ata do Copom, e avalia que o impacto desse dinheiro adicional deve ir majoritariamente para consumo ou pagamento de dívidas — o que tende a manter a economia aquecida e dificultar o corte de juros.
Danilo Igliori reforça que a própria ata deixa claro que o Banco Central não tem pressa. Segundo ele, o Copom segue operando sob um cenário de incertezas externas, especialmente ligadas aos Estados Unidos, e internas, com destaque para a inflação de serviços, mais sensível à renda.
Mesmo com sinais de moderação da inflação cheia, a persistência desse núcleo inflacionário, somada a estímulos fiscais, empurra o início do afrouxamento monetário para mais adiante.
Na avaliação dos dois economistas, algo relevante precisa mudar nos dados — seja na atividade, no mercado de trabalho ou no comportamento da inflação — para que o Banco Central se sinta confortável em iniciar o ciclo de cortes. Veja os detalhes da opinião dos especialistas no vídeo a seguir.
Em suma, as apostas dos analistas para o início do corte de juros segue incerta. A definição deve de fato acontecer quando a inflação convergir totalmente para o centro do teto da meta, que é de 3% ao ano. Até lá, a sinalização é clara: a Selic deve permanecer elevada por mais tempo do que o mercado gostaria, podendo cair em março ou só muito depois.