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As leis tributárias, os prazos e o descaso do poder público

O advento da Reforma Tributária escancarou a negligência do Estado e a falta de comprometimento com os prazos criados pelo próprio poder público. A emenda constitucional de 2023, que trouxe a reforma tributária, também estabeleceu que o Poder Executivo deveria enviar, em 90 dias, sua proposta para a reforma da tributação sobre a renda e da folha de salários. Esse prazo foi completamente ignorado.

Um Projeto de Lei que altera algumas disposições da tributação da renda (mas que jamais pode ser considerado uma Reforma efetiva) só foi apresentado 450 dias depois do prazo. Já a reforma da tributação sobre a folha nunca veio.

Ainda mais grave que o atraso no envio de projetos de lei, é a demora na adoção de medidas essenciais para o funcionamento do novo sistema fiscal. Como já mencionei nas colunas anteriores, a Reforma criou o IBS, cuja administração é compartilhada entre Estados e Municípios. Para que isso funcione, exige-se a criação de um Comitê Gestor, órgão formado por representantes estaduais e municipais, cuja finalidade será de administrar o novo tributo e editar as normas necessárias para sua operacionalização.

No entanto, o projeto de lei do Comitê Gestor – o PLP 108/24 – que deveria ter sido aprovado em 2024, ficou adormecido por quase um ano no Senado. Com um grande esforço legislativo, deverá ser aprovado no segundo semestre, ou seja, às vésperas do início da implementação da Reforma, prevista para 2026. Sem esse Comitê a Reforma não existe. Trata-se da consequência da péssima opção política pela criação de dois tributos na reforma, um de competência federal (a CBS) e outro, de competência compartilhada entre estados e municípios (o IBS). Em praticamente todo o mundo, o IVA é um imposto único, porém, por desconfiança federativa, estados e municípios brasileiros decidiram ter imposto próprio, diferente daquele da União. Essa incapacidade do diálogo federativo para criação do imposto único já deveria sinalizar que a administração do IBS também seria turbulenta.

A solução – o remendo – veio com a criação de “Comitê Gestor Provisório” válido somente até dezembro de 2025. O Comitê Provisório deveria ser instituído “em até 120 dias” da publicação da lei”, ou seja, até 16 de maio de 2025. Nas vésperas da eleição dos seus membros, duas entidades representantes dos Municípios começaram uma briga pelos cargos. Entre acusações de descumprimento de acordos, a associação que representa os maiores municípios conseguiu uma liminar que suspende a eleição dos membros e, atrasa, sem previsão de desfecho, o funcionamento do Comitê Gestor.

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Trata-se de prazo, estabelecido em lei, mas descumprido pelo poder público, sem que os envolvidos tenham qualquer responsabilização, civil ou administrativa. Ao contrário, será o contribuinte quem arcará com as consequências desse atraso.

Para agravar a situação, os estados decidiram instalar o Comitê Gestor sem os municípios, apenas para que o Comitê já receba repasses da União, ainda que, sem representantes municipais, o órgão não possa tomar nenhuma decisão oficial. A Confederação Nacional de Municípios já publicou nota alegando que a instalação do Comitê não é legítima, em um prenúncio de novo litígio sobre o tema.

A demora na instalação do Comitê – além do custo para os cofres públicos – implica na postergação da regulamentação necessária para uma reforma que passa a valer já a partir de janeiro de 2026. Enquanto os contribuintes encontram-se perdidos em relação aos novos documentos fiscais e aguardam as orientações e normas do Comitê Gestor, os representantes dos municípios brigam por poder e descumprem prazos legais.

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Caso os contribuintes não observem os prazos legais – ainda que as normas que os veiculem venham a ser editadas poucos dias antes de 2026 – haverá aplicação de multas. A impunidade no descumprimento de prazos, pelo visto, é um privilégio exclusivo do poder público.

Enquanto empresas tentam, na medida do possível, se preparar para a Reforma em 2026, os representantes do poder público – seja federal, estadual e municipal – que deveriam agilizar as providências para uma transição suave, tratam os prazos legais como uma mera sugestão, cujo descumprimento não trará responsabilização ou maiores consequências.

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