Um estudo inédito revelou que a intensificação de ondas de calor extremo, impulsionadas pelo aquecimento global causado pela queima de combustíveis fósseis, provocou a redução de até 38% nas populações de aves tropicais entre 1950 e 2020.
A pesquisa, publicada na revista Nature Ecology and Evolution, é a primeira a usar técnicas de “atribuição climática” para identificar a impressão digital das mudanças climáticas na queda de populações de vida selvagem.
Essa metodologia já é usada para relacionar eventos climáticos extremos à ação humana, mas nunca havia sido aplicada diretamente à fauna.
Calor extremo e mortalidade
Os cientistas concluíram que o aumento da frequência e da intensidade de ondas de calor extremo tem impacto direto e duradouro nas aves. Temperaturas elevadas podem levar à morte por hipertermia e desidratação, além de comprometer a condição física, afetando reprodução e sobrevivência.
Os dados usados na análise vêm do Living Planet Index, mantido pela ONG WWF, que reúne o mais abrangente banco de dados sobre populações de animais no mundo, embora ainda com lacunas, especialmente em regiões do Sul Global.
Ao comparar os registros históricos com um cenário hipotético sem mudanças climáticas, os pesquisadores calcularam que o aquecimento global causado pela ação humana foi responsável por uma queda de 25% a 38% na abundância de aves tropicais no período analisado.
Tropicais mais vulneráveis
A maior parte das perdas foi registrada em regiões de baixa latitude, onde as espécies já vivem próximas ao limite de tolerância térmica. Isso explica por que populações vêm caindo mesmo em florestas tropicais intactas, algo que intrigava biólogos há décadas.
Estudos anteriores já haviam identificado quedas expressivas: em uma área preservada da Amazônia, por exemplo, a abundância de aves caiu mais de 50% entre 2003 e 2022; resultado semelhante foi registrado no Panamá.
Os autores alertam que, nos trópicos, os impactos climáticos sobre as aves já podem ser comparáveis aos causados por desmatamento e degradação de habitat.
E ressaltam: estratégias de conservação precisarão incluir medidas contra eventos extremos de calor, não apenas a criação de áreas protegidas.
Consequências para a conservação
O estudo sugere que, em algumas regiões, será preciso desenvolver planos para proteger espécies vulneráveis após ondas de calor, secas e incêndios florestais.
Na Austrália, por exemplo, há projetos em andamento para salvar animais ameaçados após eventos climáticos extremos.
Os resultados evidenciam a urgência de incluir extremos climáticos, e não apenas médias anuais de temperatura, nas projeções de risco para a biodiversidade.