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‘Apocalipse nos Trópicos’ expõe projeto de poder evangélico em Brasília

Em 2016, quando filmava Democracia em Vertigem, indicado ao Oscar de melhor documentário, a diretora Petra Costa se deparou com um universo, então, pouco conhecido para ela. Evangélicos alinhados ao então deputado federal Cabo Daciolo oravam na Câmara, ungindo as mesas dos legisladores. Naquele dia, começaria a votação que resultou no impeachment de Dilma Rousseff, um dos marcos que desenhou a polarização política extrema do Brasil de hoje. A cena agora abre seu novo filme, Apocalipse nos Trópicos, que acaba de chegar aos cinemas e, no dia 14, entra no catálogo mundial da Netflix

Ao mergulhar nesse mundo, Petra se propôs a entender a forte influência da fé na política e se deparou com um projeto de poder em andamento, o qual desafia bases democráticas, especialmente a separação entre Igreja e Estado. “Existe uma corrente chamada teologia do domínio, que é a ideia de que cristãos devem tomar todas as posições de poder, das finanças até a política e a cultura. Com o princípio de dominar o executivo, legislativo e judiciário”, analisa ela em entrevista a VEJA. “A gente vê esse projeto em curso e damos muito pouca atenção a isso, tanto que ele já está se efetivando.” 

Com coprodução americana e dinamarquesa, entre as empresas envolvidas está a Plan B, do ator Brad Pitt, o filme brasileiro vem sendo exibido em diversos festivais pelo mundo desde o ano passado, quando estreou em Veneza. Segundo Petra, a recepção internacional tem sido de identificação. “Em todos os lugares onde o filme passou, até agora, as pessoas se enxergam de uma forma muito profunda”, conta. “Nos Estados Unidos, é arrepiante, parece até uma alegoria do que se passou e está se passando lá. A Índia também se identifica muito. Mesma coisa na Europa. Infelizmente, é um fenômeno global.”

Produtora e co-roteirista do filme, Alessandra Orofino ressalta uma das qualidades do filme e da obra de Petra Costa. “Minha vontade de trabalhar com a Petra surgiu ao notar que ela tem uma curiosidade genuína”, disse Alessandra. “Em Apocalipse nos Trópicos, ela tem um olhar que não só é generoso, como é curioso antes de tudo, e tem interesse em entender pessoas que pensam de forma muito diferente da gente.” Petra brinca que foi “sequestrada pela política” quando deixou de fazer documentários pessoais para se embrenhar nos bastidores do poder em Brasília. “Meu primeiro filme é sobre a dor de perder uma irmã e a transição para a adolescência, depois, o segundo, é a transição para a maternidade, que é a dor de perder a si mesma. E aí começa um terremoto político no país e vira uma investigação sobre a dor de perder uma democracia”, analisa ela sobre sua obra, do poético Elena (2012) e Olmo e a Gaivota (2014) até Democracia em Vertigem (2019). “Como artista, a gente tem que ser comprometida com o nosso próprio tempo. Não dá para continuar falando só de questões pessoais quando o Brasil está num momento tão difícil.”

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