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Acelerada clássica: motos custom ganham espaço no mercado brasileiro

Seria exagerada simplificação, em tom quase irônico, tratar um dos ícones da contracultura, Sem Destino (Easy Rider, no título em inglês), de 1969, como um filme de motocicletas. O irascível ator e diretor americano Dennis Hopper (1936-2010) desdenhava dessa ligeira definição, por ver no longa, dirigido por ele, um ícone da liberdade, do direito e de ir e vir. Na trama, Billy (Hopper) e seu parceiro, Wyatt, vivido por Peter Fonda (1940-2019), cruzam os Estados Unidos, saindo da Califórnia rumo a Nova Orleans, a bordo de duas potentes Harley-Davidson. O tempo passou, o mundo mudou, adeus às ilusões, e mesmo que a obra seja ainda reverenciada e aplaudida, não há como escapar da força mítica daqueles veículos de duas rodas, de ronco permanente.

INFLUÊNCIA - Cena do filme Sem Destino, de 1969: marco da contracultura
INFLUÊNCIA - Cena do filme Sem Destino, de 1969: marco da contraculturaColumbia Pictures/AFP

Sem Destino é, sim, também uma ode às motocicletas, sobretudo às clássicas, como as pilotadas por Billy e Wyatt — e soa natural que a dupla da ficção ganhe novo relevo, de mãos dadas com um fenômeno, a expansão de mercado de um segmento conhecido como custom, de visual retrô e mecânica simples. Em 2024, ele representou 1,4% de um total de 1,8 milhões de motos vendidas no Brasil, em naco que representa o dobro de 2023. Pode parecer fatia pequena, mas o crescimento acelera — atrelado ao interesse nostálgico também nos Estados Unidos e países da Europa. São veículos que se destacam em estradas e que nada têm a ver com a estúpida agressividade de ruas e avenidas das metrópoles.

Embora custom, em inglês, seja um adjetivo colado a produtos personalizados, ao gosto do freguês, no Brasil o termo passou a ser usado para se referir a motocicletas vintage, com jeitão do período que vai de 1930 a 1960, adequadas a longas viagens, com guidão elevado, bancos mais baixos e pedaleiras avançadas. Por um bom tempo, o consumidor brasileiro tinha poucas opções à sua disposição. Havia as Harley-Davidson, sim, mas de valor elevado. Modelos como a Heritage Classic, por exemplo, custam em torno de 140 000 reais. Para atender à demanda, a indiana Royal Enfield começou a trazer suas unidades para o país. Com valor mais acessível — a popular Hunter 350 custa 22 000 reais —, ajudaram a oferecer tração às compras. Embora menos potentes que uma Harley, entregam uma experiência de direção confortável. Hoje, quatro dos cinco modelos mais vendidos no país na categoria são da montadora indiana. Há fila de espera de vários meses para algumas das motos mais cobiçadas da fabricante.

ÍCONE CARO - Harley-Davidson Heritage Classic: 140 000 reais
ÍCONE CARO – Harley-Davidson Heritage Classic: 140 000 reais-/Divulgação
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Com o êxito, outras marcas também decidiram fazer apostas. As chinesas Shineray e Haojue têm portfólios compostos principalmente por modelos de baixas cilindradas, mas já oferecem motos de apelo clássico, voltadas para travessias de longa quilometragem. Há fabricantes americanas, como a Triumph, que também atuam nesse segmento. Outras, como a Honda e a Suzuki, já venderam modelos icônicos no mercado brasileiro, como a Shadow e a Intruder.

arte motos

O apelo romântico é real, mas existe explicação econômica. As clássicas podem ser mais baratas e de fácil manutenção, embora as Harley e outras grifes de luxo abusem dos preços. Com outro ponto crucial: as custom são menos visadas pelos ladrões, sempre de olho vil nas máquinas simples ou de alta cilindrada. Em tempos de insegurança viária, é algo a se levar em consideração. Não dá para sair por aí totalmente sem destino, é verdade, mas há um agradável quê de saudável saudosismo.

Publicado em VEJA de 8 de agosto de 2025, edição nº 2956

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