O primeiro dia de julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro nesta terça-feira, 2, repercutiu na imprensa internacional. Bolsonaro, que não compareceu à sala de audiências da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), é acusado de uma série de crimes pela Procuradoria-Geral da República (PGR): liderar ou integrar organização criminosa armada, atentar violentamente contra o Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado por violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.
Além do ex-presidente, Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin); Almir Garnier, ex-comandante da Marinha; Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de segurança do Distrito Federal; Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI); Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa; Walter Braga Netto, ex-ministro de Bolsonaro e candidato à vice na chapa de 2022; e Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, também estão no banco de réus.

O jornal britânico The Guardian afirmou, no título, que “Jair Bolsonaro enfrenta justiça por suposta tentativa de usurpar a democracia brasileira”. A reportagem frisou que é “a primeira vez na história brasileira que figuras tão poderosas enfrentaram a justiça por tentarem derrubar a democracia do país” e relembrou que “o Brasil sofreu mais de uma dúzia de tentativas de golpe de Estado e golpes de Estado desde 1889, quando se tornou uma república após a deposição de seu último imperador, D. Pedro II”.
“Bolsonaro está em prisão domiciliar desde o início de agosto, após o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir que ele violou uma ordem judicial que o proibia de usar as redes sociais. Policiais estão posicionados em frente à sua mansão, temendo que ele possa fugir para a embaixada americana próxima”, disse o jornal, que também lembrou a “campanha de pressão sem precedentes” do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que “abalou as relações EUA-Brasil”.
“No início deste mês, a polícia alegou ter encontrado um documento em um telefone apreendido com o ex-presidente, indicando que ele planejava fugir para a Argentina e pedir asilo ao presidente de direita, Javier Milei”, concluiu.

Os jornais americanos The New York Times e The Washington Post também deram destaque ao julgamento. O NYT disse que “Jair Bolsonaro teve apenas nove semanas para executar um plano arriscado e extraordinário. Com a ajuda de aliados, dizem os procuradores, ele pretendia anular a eleição presidencial de outubro de 2022, que havia perdido”, acrescentando: “Com um vasto acervo de provas processuais, a maioria dos analistas afirma que é quase certo que ele será considerado culpado e poderá enfrentar décadas de prisão.”
O Washington Post optou por salientar a pressão de Trump e o conturbado histórico brasileiro, com o título “No julgamento de Bolsonaro, o Brasil confronta Trump — e seu passado autoritário”. A reportagem cita as acusações do republicano de que o governo brasileiro e o STF conduzem uma “caça às bruxas” contra Bolsonaro “usando o poder financeiro e diplomático dos EUA contra o Brasil para tentar forçar uma mudança de rumo”. Ao mesmo tempo, aponta que “desde a sua fundação, o espectro do autoritarismo paira sobre o Brasil” e que “o país sofreu mais de uma dúzia de tentativas de golpe e passou décadas sob ditaduras”.
“Mas ninguém na história brasileira — nem general nem político — jamais foi julgado em um tribunal por subverter a vontade do povo. Até agora”, continua o texto. “Na terça-feira, o ex-presidente Jair Bolsonaro, a figura conservadora mais popular do Brasil, será julgado no Supremo Tribunal Federal — acusado de tentar usar a força militar para derrubar a democracia após sua derrota eleitoral para o esquerdista Luiz Inácio Lula da Silva em 2022.”

O jornal espanhol El País, por sua vez, definiu o julgamento como “histórico” e salientou que a trama golpista supostamente liderada pelo ex-presidente e aliados “culminou no ataque de milhares de bolsonaristas às sedes dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário em 8 de janeiro de 2023”, informando também que “Bolsonaro estava nos Estados Unidos naquele dia”. O veículo indica que, embora tenha alegado inocência, Bolsonaro “admitiu que realizou reuniões para discutir opções para anular o resultado da eleição”.
Já o francês Le Figaro afirmou que trata-se de “um momento histórico, quarenta anos após o fim da ditadura militar (1964-1985), cujos líderes nunca foram levados à Justiça” e informou que “em Brasília, a segurança foi reforçada na emblemática Praça dos Três Poderes, onde o Palácio do Planalto, o Parlamento e o Supremo Tribunal Federal ficam lado a lado”, acrescentando: “Foi nesta praça que, em 8 de janeiro de 2023, milhares de apoiadores bolsonaristas saquearam os assentos do poder, exigindo intervenção militar para depor Lula”.
A agência de notícias Reuters também destacou as tentativas do presidente dos Estados Unidos de tentar influenciar o processo, afirmando que “a reta final do julgamento, prevista para terminar em 12 de setembro, se desenrolará sob os holofotes do presidente dos EUA, Donald Trump, cujo governo está analisando o caso que ele denunciou como uma ‘caça às bruxas’ contra seu aliado brasileiro”. A reportagem deu atenção, ainda, ao discurso do ministro Alexandre de Moraes, do STF, alvo de sanções do governo americano.
“Em seu discurso de abertura na terça-feira, Moraes disse que uma “organização criminosa” tentou coagir a submissão do tribunal superior ao ‘escrutínio de um estado estrangeiro’. Ele disse que esses esforços não afetariam a decisão do tribunal porque ‘a soberania nacional não pode, não deve e nunca será difamada, negociada ou extorquida’”, relatou a agência.