A disputa pela vaga aberta com a aposentadoria antecipada de Luís Roberto Barroso no Supremo Tribunal Federal colocou o Brasil diante de uma situação rara: três nomes de alta qualidade, com sólida formação jurídica e experiência institucional comprovada, disputando, direta ou indiretamente, a mesma cadeira. Bruno Dantas, Jorge Messias e Rodrigo Pacheco representam trajetórias distintas, mas convergentes em um ponto central: todos reúnem credenciais técnicas e biográficas compatíveis com a responsabilidade de integrar a mais alta corte do país. Em tempos de desconfiança generalizada em relação às instituições, não é pouco.
Bruno Dantas, ministro e ex-presidente do Tribunal de Contas da União, é doutor e mestre em Direito pela PUC-SP, com pós-doutorado pela UERJ. Sua passagem pelo Senado, CNJ e CNMP configura um perfil de jurista familiarizado com órgãos de controle e com o ambiente de elaboração normativa.
Rodrigo Pacheco, presidente do Senado e do Congresso Nacional, é advogado criminalista formado pela PUC-Minas, ex-conselheiro da OAB e ex-presidente da CCJ da Câmara. Sua trajetória parlamentar oferece conhecimento do processo legislativo e das interfaces entre os poderes.
A escolha de Lula recaiu sobre Jorge Messias, atual advogado-geral da União. A decisão segue uma tradição consolidada na história recente brasileira: presidentes indicam para o Supremo pessoas de sua confiança política com densidade jurídica reconhecida. Fernando Henrique Cardoso indicou, entre outros, Gilmar Mendes. Lula, em diferentes mandatos, levou ao STF nomes como Dias Toffoli, Cristiano Zanin e Flávio Dino. Michel Temer indicou Alexandre de Moraes; Jair Bolsonaro indicou André Mendonça e Kassio Nunes Marques. Em todos esses casos, a confiança pessoal conviveu com trajetórias marcadas por magistério, produção acadêmica, atuação institucional e experiência jurídica robusta.
O perfil de Messias se encaixa nesse padrão. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, mestre e doutor pela Universidade de Brasília, ele construiu carreira na Advocacia-Geral da União como procurador da Fazenda Nacional, tendo passado também pelo Banco Central, BNDES e por funções estratégicas na Casa Civil e em ministérios. Desde 2023, à frente da AGU, representou o governo em casos relevantes no STF, incluindo ações ligadas aos ataques de 8 de janeiro de 2023 e a temas tributários e fiscais de alta complexidade. Um jurista com dupla experiência: técnico de carreira na advocacia pública e articulador político-institucional no centro do governo.
Além das credenciais formais, a recepção da indicação no próprio Supremo reforça sua qualificação. Ministros de diferentes perfis ideológicos, como Luiz Fux e André Mendonça, manifestaram-se publicamente em seu favor, sublinhando sua competência técnica, a experiência à frente da AGU e o trato institucional correto, mesmo em situações de dissenso. Esse apoio público — vindo tanto de ministros identificados com a maioria atual da Corte quanto de um indicado por Jair Bolsonaro — sinaliza reconhecimento interno de que o indicado reúne as qualificações necessárias para a função.
O fato de o governo ter chegado a uma tríade dessa qualidade — Dantas, Pacheco e Messias — é um sinal de vitalidade do sistema. Ao contrário da crítica de que a politização das indicações implica necessariamente em perda de qualidade técnica, o quadro atual mostra que ainda existe um estoque relevante de juristas e agentes públicos capazes de transitar entre técnica e política sem abrir mão de credenciais acadêmicas e profissionais consistentes. O problema não foi falta de bons nomes, mas a inevitável necessidade de escolha por apenas um deles.
A indicação de Messias não desmerece os outros dois candidatos, nem apaga o fato de que o Brasil, desta vez, teve o privilégio de poder escolher entre três perfis sólidos. Ela traduz a lógica própria do presidencialismo de coalizão: entre opções qualificadas, prevalece aquele que combina melhor confiança pessoal, alinhamento programático e capacidade de diálogo com o Congresso e com a própria Corte.
Resta agora ao Senado exercer seu papel constitucional. A sabatina deve ser rigorosa, mas também conduzida com senso de responsabilidade institucional. Para além das disputas políticas entre poderes — que muitas vezes rebaixam o Legislativo em reação ao ativismo judicial —, a Casa tem a oportunidade de avaliar três dimensões essenciais: a institucionalidade da prerrogativa presidencial de indicação, a experiência acumulada do indicado e sua formação jurídica. Esses critérios, aplicados com seriedade, permitem ao Senado cumprir sua função constitucional de fiscalização sem descambar para o confronto institucional ou para a chancelação automática.