A China decidiu redesenhar suas cidades. Após décadas de crescimento acelerado baseado na expansão imobiliária, o governo de Xi Jinping agora propõe um novo paradigma: investir em cidades inteligentes, integração regional e infraestrutura sustentável.
O objetivo é tornar as metrópoles mais atraentes, eficientes e resilientes até 2035.
A mudança de rumo ocorre em meio ao colapso do setor imobiliário, com gigantes como a Evergrande à beira da falência, milhões de apartamentos vazios e municípios endividados. O Partido Comunista admite que o modelo de crescimento pelo “boom do concreto” se esgotou e quer substituir quantidade por qualidade.
Nos últimos dez anos, as cidades se expandiram em 40% de área, mas hoje acumulam imóveis ociosos e déficits fiscais. O novo plano urbano propõe reverter essa lógica, priorizando reformas habitacionais, revitalização de bairros e infraestrutura moderna, em vez de novas torres residenciais.

Segundo projeções oficiais, mais da metade da demanda futura por imóveis virá de reformas e não de construções inéditas. Para viabilizar a transição, será necessário redesenhar a estrutura fiscal, já que governos locais dependiam da venda de terrenos para financiar obras.
O ponto central do programa são os clusters urbanos: redes metropolitanas formadas por uma cidade-polo conectada a municípios vizinhos por transporte rápido.
Exemplos como o delta do Rio Yangtzé, a Greater Bay Area (Guangdong–Hong Kong–Macau) e Jingjinji (Pequim–Tianjin) devem servir de modelos.
A ideia é integrar mercados de trabalho, consumo e serviços, criando polos de inovação.
A modernização da infraestrutura é outro eixo essencial. Malhas metroviárias em expansão, como as de Shenzhen e Guangzhou, entre as maiores do planeta, mostram o caminho.
O governo acredita que conexões mais rápidas podem gerar ganhos de produtividade comparáveis aos da Revolução Industrial no Ocidente.

Mas o custo é alto: só em obras básicas, como saneamento e drenagem, serão necessários cerca de 4 trilhões de yuan (3 trilhões de reais) nos próximos cinco anos.
A digitalização da gestão urbana é vitrine do projeto. Plataformas superinteligentes, alimentadas por dados e inteligência artificial, já estão em uso em metrópoles como Hangzhou, que utiliza o sistema para reduzir congestionamentos, monitorar a poluição e agilizar emergências.
O plano também prevê cidades mais resilientes às mudanças climáticas.
Com secas crescentes na região de Pequim e risco de elevação do nível do mar em áreas costeiras, a estratégia inclui construção de reservatórios, reforço de diques e criação de “cidades-esponja”, áreas urbanas capazes de absorver fortes chuvas e evitar enchentes.
A cidade de Xiong’an, concebida como “cidade modelo” de Xi Jinping, é o maior laboratório dessa política.
Recebeu até agora 835 bilhões de yuans (620 bilhões de reais) em investimentos públicos e deveria se tornar um polo tecnológico verde.
O redesenho das cidades chinesas representa uma guinada estratégica: abandonar o modelo baseado em construção em massa e migrar para urbanização sustentável, clusters regionais e cidades inteligentes.
O sucesso, no entanto, dependerá de fatores cruciais: equilíbrio fiscal dos governos locais, capacidade de atrair investimentos privados, inclusão de migrantes barrados pelo sistema hukou e conciliação entre inovação tecnológica e direitos civis.
