O Brasil adora celebrar a veia empreendedora de seu povo. Mas, por trás do discurso, existe um grupo que sustenta parte significativa da economia na base e tem baixa visibilidade: as mulheres negras empreendedoras.
Levantamento inédito do Instituto Locomotiva revela que há 473,4 mil mulheres negras empreendendo na Região Metropolitana de São Paulo. Elas são muitas, desenvolvem negócios a partir de saberes herdados e compartilhados, com inteligência e criatividade, mas enfrentam diversos desafios. Seis em cada dez sobrevivem com até um salário-mínimo de seus negócios e apenas 5% ultrapassam quatro salários-mínimos. Entre as mulheres brancas, só um terço está na base da renda e 16% superam quatro salários. Já entre homens brancos, apenas 22% recebem até um salário-mínimo.
Há também desafios na estruturação do negócio. Oito em cada dez empreendem sozinhas, apenas 27% têm CNPJ e mais da metade não conta com espaço próprio para trabalhar. A maioria mistura as contas do negócio com as da casa e só 9% conseguem poupar regularmente. Além disso, quando perguntadas sobre estabilidade financeira, 29% a associam apenas a ter uma reserva mínima de emergência, e 18% admitem que não conseguiriam se sustentar sequer um mês sem trabalhar.
Ainda assim, o empreendedorismo é visto como espaço de autonomia e potência. Sete em cada dez planejam expandir seus negócios nos próximos anos. Muitas buscam atualização constante com alguma estratégia para aprender, como acompanhar perfis nas redes sociais ou trocar experiências com outras empreendedoras. As redes digitais, aliás, são centrais. A maioria delas usam aplicativos de mensagens e muitas também recorrem às redes sociais para vender e divulgar seus produtos
O que leva tantas mulheres a empreenderem? De um lado, demandas objetivas como a perda de emprego, dificuldade de reinserção no mercado de trabalho formal e maternidade sem apoio. De outro, saberes herdados, aptidões desenvolvidas e percepção de lacunas de mercado não atendidas.
É preciso, portanto, enxergar que apoiar essas empreendedoras não é apenas corrigir desigualdades históricas. É reconhecer um motor de inovação e desenvolvimento econômico que pulsa nas periferias. Linhas de crédito desenhadas para sua realidade, capacitação continuada, consultoria e redes de trocas com outras empreendedoras, apoio indireto, como creches e centros de cuidado para crianças, estão entre as soluções mais apontadas por elas.
Se quisermos construir um Brasil mais próspero e justo, precisamos enxergar nessas mulheres o protagonismo do futuro econômico do país.