Deputados próximos ao presidente da Câmara relatam indignação com o que seria um desprezo por parte do ministro Alexandre de Moraes ao ignorar uma ação apresentada por Hugo Motta (Republicanos-PB) há quatro meses.
Em maio, a Mesa da Câmara ingressou com uma ação no Supremo Tribunal Federal após um imbróglio envolvendo o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), o único parlamentar condenado no inquérito sobre a tentativa de golpe.
A ação foi distribuída por prevenção a Alexandre de Moraes. O ministro deixou o pedido engavetado, jamais se manifestou sobre ele e manteve o andamento do processo contra o deputado sem dar explicações adicionais.
A confusão envolve uma resolução, aprovada com o aval de mais de 300 votos, que suspendia toda a ação penal contra Ramagem sob o argumento de que a Constituição prevê a sustação dos processos referentes a crimes cometidos após a diplomação no cargo. O ex-diretor da Abin foi diplomado em dezembro de 2022, e dois dos cinco crimes imputados a ele teriam sido cometidos nos ataques do 8 de janeiro de 2023.
O Supremo considerou a decisão dos deputados uma afronta e manteve o andamento parcial da ação penal, suspendendo apenas os crimes relativos ao mês de janeiro. A Câmara, em resposta, também reagiu e ingressou com um recurso na Corte pedindo a revisão da decisão porque ela representaria uma “violação direta e frontal aos preceitos fundamentais da separação de Poderes e da imunidade parlamentar formal”.
“Ao restringir, de forma absoluta e desproporcional, o alcance da prerrogativa conferida constitucionalmente ao Parlamento, a decisão esvazia o papel do Poder Legislativo na contenção de eventuais abusos no exercício da persecução penal contra seus membros”, registra a Câmara em parecer assinado por Hugo Motta. Moraes nunca respondeu à ação.
Ação e reação
A derrubada da decisão da Mesa e a consequente falta de resposta de Moraes ao recurso da Câmara são apontadas por importantes caciques partidários como um gatilho para que deputados também ignorem a determinação da perda imediata do mandato de Ramagem, condenado a 16 anos e um mês de prisão.
Como mostra reportagem de VEJA desta edição, ganha corpo na Câmara dos Deputados um movimento para dar sobrevida ao deputado condenado e mantê-lo na função parlamentar mesmo quando for preso. A ideia é protelar a ordem de cassação dada pelo STF e apenas decretar a perda do mandato mais adiante, quando Ramagem eventualmente ultrapassar o limite de faltas permitido.
“O fato é que ele está condenado por uma decisão que o Supremo tomou descumprindo uma decisão da Câmara. Mas agora a Câmara tem de seguir a decisão do Supremo? Não existe um poder acima de outro”, afirma um dos defensores de que o ex-chefe da Abin ganhe mais tempo no mandato.
O rito processual define que, após o trânsito em julgado do processo, o Supremo oficie a Câmara sobre a perda do mandato. A Mesa Diretora, na sequência, encaminha o caso para deliberação da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que abrirá espaço para a oitiva do acusado e de testemunhas e na sequência votará um parecer. O plenário da Câmara dá a palavra final.
Já se houver a perda de mandato por extrapolar o limite de faltas, a cassação se dá por um ato unilateral do presidente da Câmara – que ocorre, portanto, sem estar vinculado à ordem da Suprema Corte.