O Irã chegou a um acordo com a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), órgão ligado às Nações Unidas, que estabelecerá as bases para o retorno de inspetores às instalações nucleares do país. A informação foi divulgada pelo diretor-geral da AIEA, Rafael Grossi, na última terça-feira, 9, por meio de uma publicação no X (ex-Twitter).
“Hoje, no Cairo, concordamos com o ministro das Relações Exteriores do Irã, Abbas Araqchi, sobre as modalidades práticas para retomar as atividades de inspeção no Irã. Esse é um passo importante na direção certa”, declarou Grossi.
In Cairo today, agreed with Iran’s Foreign Minister @araghchi on practical modalities to resume inspection activities in Iran. This is an important step in the right direction.
Grateful to Egypt’s @MfaEgypt Badr Abdelatty for his commitment and engagement. pic.twitter.com/ATg4AtH6C3— Rafael Mariano Grossi (@rafaelmgrossi) September 9, 2025
A reunião entre o diretor-geral da AIEA e Abbas durou cerca de três horas, e estabeleceu que o retorno das inspeções é uma condição essencial para que os líderes europeus adiem a retomada de sanções econômicas contra o país, que aconteceria no final do mês. Para a chefe da diplomacia da União Europeia, Kaja Kallas, o acordo pode ser um “passo decisivo para a diplomacia nuclear se implementado rapidamente pelo Irã”.
O acordo não foi publicado na íntegra, causando insatisfação em políticos de Teerã, que exigem acesso ao texto. Há tensões com o parlamento iraniano, que aprovou uma lei recente proibindo o retorno dos inspetores sem garantias sobre a segurança futura das instalações nucleares do país, que foram bombardeadas por Israel e Estados Unidos em junho.
Em um comunicado divulgado pela mídia estatal iraniana, Araqchi declarou que o acerto prevê um mecanismo de cooperação que atende tanto as exigências técnicas da AIEA quanto as “circunstâncias excepcionais de segurança” do Irã. No entanto, Grossi fez questão de frisar que a legislação gerou dificuldades, uma vez que as garantias não estão totalmente ao alcance do corpo de inspetores da ONU.
Segundo o diretor-geral, o acordo deu os inspetores o acesso a “todas as instalações e locais no Irã, e também contempla os relatórios necessários sobre as instalações atacadas, incluindo o material nuclear”, em uma referência ao estoque de 440 kg de urânio enriquecido a nível de 60% de pureza sob posse de Teerã, cujo paradeiro é atualmente desconhecido.
Grossi reconheceu que o acordo ainda não foi implementado, e que possivelmente haverá dificuldades antes de seu pleno funcionamento. As principais preocupações iranianas dizem respeito à confiabilidade da AIEA, uma vez que há temores de que a agência informe Washington ou Tel Aviv sobre os planos nucleares do país.
Acordo nuclear
O Reino Unido, a França e a Alemanha notificaram formalmente as Nações Unidas no final de agosto para avisar que acionaram a restauração de sanções abrangentes do Conselho de Segurança contra o Irã. A medida deu um prazo de trinta dias para Teerã fazer concessões e ampliar o acesso à AIEA para inspeções em suas instalações nucleares. Do contrário, o país enfrentaria um isolamento econômico global ainda mais profundo.
Londres, Berlim e Paris acusam o Irã de ter descumprido significativa e repetidamente os termos do acordo nuclear de 2015. O pacto firmado entre a nação persa e os membros do Conselho de Segurança da ONU (mais Alemanha) encerrou as sanções econômicas ao país em troca de restrições ao seu programa nuclear e a permissão de que a AIEA fizesse fiscalizações regulares nas instalações pertinentes.
Funcionários do órgão de fiscalização nuclear das Nações Unidas, porém, vinham sendo impedidos de realizar seu trabalho de inspeção desde os ataques de Israel e Estados Unidos ao Irã, em junho, tendo permitido acesso apenas à instalação de reabastecimento de Bushehr. Por isso, o trio europeu recorreu ao mecanismo do “snapback“, uma cláusula do acordo firmado junto às Nações Unidas que permite reativar imediatamente as sanções econômicas contra o país, sem possibilidade de veto por parte dos demais membros.
Justificando a decisão, autoridades britânicas, alemãs e francesas relembraram que o pacto de 2015 restringia a 300 kg a quantidade de urânio enriquecido que o Irã podia armazenar, com índice de pureza de no máximo 3,67%. Em vez disso, o estoque iraniano tornou-se 45 vezes maior do que o limite, com uma quantidade relevante de urânio com até 60% de pureza — muito próximo dos 90% necessários para a produção de armas nucleares.
Teerã estar “à beira de construir uma bomba atômica” — embora analistas avaliem que demoraria mais de um ano para construir uma arma funcional — foi o motivo que Israel usou para justificar os ataques que deflagraram uma guerra aérea de 12 dias entre as nações do Oriente Médio, que acabou com um cessar-fogo frágil depois que os Estados Unidos se juntaram a Tel Aviv ao bombardearem três instalações nucleares iranianas.