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O primeiro julgamento sobre golpe para educar o Brasil

 

O primeiro dia do julgamento que entra para a história do Supremo Tribunal Federal deixou claro por que este é o processo mais importante desde a redemocratização. O voto de Alexandre de Moraes não foi apenas robusto. Foi pedagógico. Um voto que educa sobre as origens, as consequências e a gravidade da tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro.

E não é robusto apenas pela capacidade jurídica de Moraes — que é imensa — mas pelo número e a força das provas apresentadas. Anotações em agendas, trocas de mensagens, depoimentos de militares. Provas que não foram fabricadas pelo Estado, mas que muitas vezes foram construídas pelos próprios acusados, registrando em detalhes como pretendiam golpear a democracia.

Moraes lembrou que as mensagens não eram trocadas por delinquentes do PCC, mas por um diretor da Abin com o presidente da República. Trouxe à memória os Atos Institucionais da ditadura, inclusive o AI-5, para demonstrar a conexão direta entre a tradição golpista brasileira e o que se tentou agora. Ao citar movimentos golpistas como os que ocorreram em 1904, 1922, 1924, 1930, 1937, 1945, 1955 e 1964, mostrou que não se tratava de um episódio isolado. O Brasil tem sido um país marcado por sucessivas tentativas de ruptura institucional — e a atual não difere disso.

O voto também é histórico porque, pela primeira vez, um juiz brasileiro condena generais e um almirante em um julgamento dessa magnitude. E, claro, um ex-presidente da República. Para um país que viveu 21 anos de ditadura, com censura, tortura e assassinato de opositores, é impossível não reconhecer a dimensão simbólica desse momento.

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A ironia é que Jair Bolsonaro, o grande admirador do golpe de 1964, pode se tornar o primeiro presidente condenado por tentativa de golpe em tempos democráticos. Moraes expôs essa contradição com clareza: não fazia sentido Bolsonaro chamar os chefes das Forças Armadas ao fim do mandato se não fosse para tentar uma ruptura institucional. Depoimentos de militares confirmam o que se tramava naquele período.

Outro ponto marcante foi a “minuta golpista”. Bolsonaro sempre tentou ridicularizar o documento, perguntando onde estava. Hoje, Moraes apresentou a todos, mostrando inclusive que o próprio ex-presidente pediu alterações que o tornavam ainda mais inconstitucional. Ali estava a prova material de um projeto de poder à margem da lei.

E há um detalhe quase literário nessa história. Alexandre de Moraes nasceu em 13 de dezembro de 1968, o dia da edição do AI-5, o mais duro ato institucional da ditadura. Décadas depois, esse mesmo homem se tornaria o algoz dos golpistas do tempo presente, sendo o primeiro a votar pela condenação de Bolsonaro e de militares de alta patente.

O julgamento é histórico e emocionante. Um espelho que obriga o Brasil a encarar sua tradição golpista e a refletir sobre os riscos de repetir tragédias já vividas. Como disse Moraes, de forma “clara e cristalina”, não se trata de acaso. É a consequência lógica da ação de um líder que nunca escondeu sua admiração pela tortura e pela violência. Agora, amantes da ditadura e  generais que não respeitam a constituição enfrentam, pela primeira vez, a Justiça.

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