A Cidade de Gaza, em ruínas após meses de bombardeios, recebeu nesta terça-feira, 9, panfletos lançados pelo Exército israelense ordenando a saída imediata da população. A medida antecede uma ofensiva em larga escala, anunciada por Israel, para destruir o que considera os últimos redutos do Hamas. É a primeira vez, desde o início desta fase do conflito, que toda a área urbana recebe uma ordem de evacuação.
Antes da guerra, a cidade abrigava cerca de 1 milhão de palestinos. Acredita-se que mais de meio milhão ainda estão lá — o local se transformou em um enorme campo de refugiados, abrigando pessoas deslocadas de cidades por todo o território que perderam suas casas e vivem em tendas improvisadas ou abrigos. Muitos já aguardavam o ataque, antecipado por planos israelenses de infligir um “golpe fatal” contra o grupo militante. “Aproveitem esta oportunidade, vocês foram avisados: saiam daí!”, declarou o primeiro-ministro do país, Benjamin Netanyahu.
Pânico entre civis
O lançamento dos panfletos provocou pânico e confusão entre moradores, que afirmam não ter para onde fugir em meio a bombardeios constantes e ao agravamento da crise humanitária. Alguns admitem seguir para o sul, mas muitos dizem não ter intenção de abandonar suas casas. Não há sinais, por enquanto, de um êxodo em massa.
Grupos humanitários alertam que uma ofensiva total na Cidade de Gaza — já em situação de fome — terá consequências devastadoras. Na terça-feira, autoridades locais informaram a morte de mais seis pessoas por inanição, elevando para 399 o total de vítimas da fome desde o início da guerra.
Hospitais também estão no limite. Os dois maiores centros ainda em funcionamento, Al Shifa e Al Ahli, anunciaram planos de evacuação, mas garantiram que pacientes não serão deixados sem assistência.
Deslocamentos sucessivos
Grande parte da população de Gaza já foi obrigada a se deslocar diversas vezes desde outubro de 2023, quando o Hamas liderou ataques contra Israel, matando 1.200 pessoas e sequestrando 251. Em resposta, a ofensiva militar de Tel Aviv já deixou mais de 63 mil palestinos mortos, conforme o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas.
Agora, os moradores são orientados a seguir para Al-Mawasi, uma chamada “zona humanitária” superlotada na costa sul, onde milhares vivem em tendas improvisadas — mas que também vem sendo alvo de bombardeios. “A escolha é entre morrer em casa ou no sul”, resumiu uma mãe de cinco filhos, de 59 anos, em entrevista à agência de notícias Reuters.
“Furacão” militar
Na segunda-feira, o ministro da Defesa israelense, Israel Katz, prometeu desencadear um “furacão poderoso” caso o Hamas não se rendesse e não libertasse os reféns que ainda mantém. Israel mobilizou dezenas de milhares de reservistas para a operação terrestre. Segundo Netanyahu, os soldados já se concentram nos arredores da Cidade de Gaza, onde o exército afirma controlar 40% do território.
A ofensiva, no entanto, pode comprometer negociações para um cessar-fogo. Até agora, não houve novos avanços de tanques dentro da cidade, mas os combates já ameaçam bloquear tentativas de acordo.
Pressão internacional
O Ministério da Saúde de Gaza pediu à comunidade internacional que intervenha para proteger os hospitais, alertando para uma “catástrofe humanitária”. Países europeus também aumentaram a pressão, anunciando a intenção de reconhecer oficialmente o Estado palestino durante a Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York, ainda neste mês. Israel e os Estados Unidos rejeitam a medida.
Críticos afirmam que o plano israelense de assumir o controle da segurança em toda a Faixa de Gaza, aliado à desmilitarização do território, pode aprofundar ainda mais a tragédia humanitária para os 2,2 milhões de palestinos que vivem ali.
Apesar da pressão de países árabes e ocidentais, Netanyahu insiste que Israel não tem alternativa senão derrotar o Hamas. O grupo, por sua vez, diz que não deporá armas sem a criação de um Estado palestino independente e que só libertará todos os reféns com um acordo de fim da guerra.
Em paralelo, uma flotilha internacional que tenta furar o bloqueio marítimo e levar ajuda humanitária a Gaza relatou, nesta terça, que um de seus barcos foi atingido por um drone em um porto da Tunísia. Ninguém ficou ferido. Entre os participantes da missão está a ativista sueca Greta Thunberg, que já havia sido detida pela Marinha israelense em junho, em tentativa semelhante.