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Vale a pena voltar? A discussão em torno da decisão de Venus Williams

Havia expectativa em torno de um momento a um só tempo emocionante e arriscado. Em 1991, aos 35 anos, depois de quase dez afastado das quadras — e com a vida pessoal aos pedaços, dois casamentos desfeitos e falência em um negócio de equipamentos esportivos —, o sueco Björn Borg, um dos maiores tenistas de todos os tempos, decidiu pisar de novo na quadra. Fracassou, fez nove partidas e não venceu nenhum set. Houve quem pusesse a culpa na raquete: pego de surpresa pelo desenvolvimento tecnológico, com materiais mais leves, Borg não quis abandonar as velhas companheiras de madeira. “Eu sempre joguei com elas”, explicou, ao justificar a vã disputa com os avanços inevitáveis. Estabelecido o desastre, instado a explicar por que decidira se arriscar, respondeu com a frieza que lhe era peculiar: “Queria jogar tênis de novo”. Ficou a marca de um passado glorioso — onze vezes vitorioso em disputas do Grand Slam —, mas a mancha da desastrosa retomada nunca mais foi apagada.

Há agora a mesma expectativa diante do anunciado retorno da americana Venus Williams ao tênis, no US Open, que começa no dia 24. Será a celebração de uma lenda do esporte, agora com 45 anos, duas vezes vencedora do torneio, em 2000 e 2001. “Acho que é simplesmente a pura diversão de jogar, a diversão do desafio, de superar muitos desafios, os oponentes, as condições, e muitas vezes a si mesmo”, disse a campeã, ao explicar as motivações para o fim da aposentadoria. Contudo, teme-se que a volta possa resultar em desilusão, a exemplo do que ocorreu com Borg.

Parece haver apenas dois caminhos: o sucesso ou o revés. Um caso bem-sucedido foi o da tcheca Martina Navratilova, que, após o afastamento, retomou a carreira em duplas, e se deu muito bem. Embora tenha se aposentado oficialmente do circuito de simples em novembro de 1994, aos 38 anos, como a jogadora mais vencedora e premiada de todos os tempos, Navratilova esperou oito anos e então continuou a competir em duplas. Seu último jogo foi a conquista do título do US Open de duplas mistas em 2006, ao lado de Bob Bryan, quando tinha 49 anos. A capacidade de se reinventar, como exceção que confirma a regra das desventuras, a manteve no topo até o fim.

OPOSTOS - Borg fracassou, mas Navratilova saiu-se bem: a tcheca foi exceção que confirma a regra
OPOSTOS - Borg fracassou, mas Navratilova saiu-se bem: a tcheca foi exceção que confirma a regraSimon Bruty/Allsport/Getty Images; Mike Hewitt/Getty Images

Renascer como Navratilova, enfim, é uma possibilidade para Venus, mas não se deve abandonar o perigo do fator Borg, chamemos assim. A encruzilhada — dará certo ou não — autoriza a pergunta que não quer calar. Por que os esportistas insistem no amargo regresso, quando já não parece mais haver condições de renascimento, quando o organismo já não se recupera com a velocidade de antes e a força muscular perde o tônus anterior? A nostalgia da fama e a necessidade de dinheiro são bons argumentos, mas não respondem tudo. A motivação de Venus, detentora de 49 títulos de simples na carreira, incluindo sete Grand Slam, mais 23 em duplas ao lado da irmã Serena, dos quais catorze são de Grand Slam, transcende a necessidade de provar algo a alguém. Apesar de uma carreira repleta de conquistas e de ter enfrentado desafios de saúde, como uma doença autoimune cujos sintomas apareceram já em 2004, ela diz querer dar o atual passo por paixão e hábito.

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Atualmente classificada em 580º lugar e listada como inativa no site da WTA até recentemente, a presença de Venus continua a atrair fãs e até patrocinadores, mas é provável que vê-la em atividade deflagre o inevitável tema em torno da idade e das condições do corpo. “Embora ela possa ter as boas sensações do passado, há um aspecto que não pode ser esquecido, o rigor implacável do circuito profissional”, afirma Eduardo Faria, preparador físico da equipe brasileira na Copa Davis.

Direto ao ponto: não há diletantismo, não há amor pelo esporte, tampouco o desejo de expressar a longevidade, que consiga pôr em mesmo patamar atletas no auge do desempenho e outros que ficaram parados algum tempo. É cruel, mas é assim. O esporte não é brincadeira. Será bonito vê-la na televisão, em Flushing Meadows, ao menos no início do US Open. Na primeira troca de bolas na quadra contra adversárias bem mais jovens, no entanto, a dura realidade tende a se impor. Superar todos esses obstáculos do presente não será uma tarefa fácil para a campeã do passado.

Publicado em VEJA de 22 de agosto de 2025, edição nº 2958

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