Uma área maior que a Bolívia é o tamanho do território de vegetação nativa desmatada no Brasil, nas últimas quatro décadas, consideradas as mais devastadoras da história do país. Ao todo, 13% do território brasileiro passou por uma limpa verde, digamos, para dar condições de sobrevivência para uma população que praticamente dobrou entre 1985 e 2024. No campo, muitas áreas naturais foram usadas para o aumento da área de cultivo de alimentos e de pastagens. Nas cidades, houve a visível expansão de moradias e de infraestrutura. Tudo feito em nome do desenvolvimento e progresso, mas sem qualquer preocupação com a sustentabilidade. A constatação surgiu a partir da análise dos últimos cem anos do uso e ocupação da terra realizada pelo MapBiomas, na última quarta-feira, 13.
O país perdeu mais floresta do que qualquer outra vegetação. Houve redução de 62,8 milhões de hectares, o equivalente ao território da Ucrânia. A supressão levou à diminuição em 22% de reservatórios de águas naturais, lagoas, pântanos, aquíferos e estruturas úmidas importantes para a regulação da biodiversidade como os manguezais.
Mas entre todas as atividades humanas, a pecuária teve, no acumulado de todo o período, maior atuação na supressão de áreas naturais, de acordo com os especialistas do estudo. “De forma geral, a expansão da pecuária parou no início dos anos 2000 e começou a se estabilizar. Atualmente, ela tem pequena tendência de queda da conversão”, diz o pesquisador Tasso Azevedo, coordenador-geral do MapBiomas. As áreas ocupadas por pastagens correspondem a 62,7 milhões de hectares. Já a agricultura tomou 44 milhões de hectares. A transformação de áreas naturais em terras produtivas foi maior no Paraná (34%), São Paulo (33%), e o Rio Grande do Sul (30%).
Em um balanço geral de perda de território natural, a Amazônia se destaca com uma supressão recorde de 52,1 milhões de hectares. Depois vem o Cerrado, com 40,5 milhões, a Caatinga, 9,2 milhões, a Mata Atlântica, com 4,4 milhões e o Pampa, 3,8 milhões. Em um ranking de supressão, o Pantanal ficaria por último com 1,7 milhões, mas a mensuração dá uma falsa interpretação, como se fosse pouco devastado. Aqui é importante colocar em perspectiva a proporção em relação ao total do território, que é de 30%. O Pantanal é um bioma 28 vezes menor que a Amazônia, com grande importância hídrica. Ele faz parte do sistema da Bacia do Alto Paraguai, que alimenta o rio homônimo e outros sistemas fluviais sul-americanos conectados ao Paraná e ao Prata. A supressão da biodiversidade natural impacta diretamente na quantidade de água do sistema, que indiretamente abastece o Nordeste, Sudeste e Sul. A mudança da paisagem explica em parte a mudança do clima nas regiões brasileiras e secas extremas.