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Sem preconceito: homens procuram cada vez mais procedimentos estéticos

Um passeio pela história da humanidade mostra que beleza e poder sempre caminharam de mãos dadas no universo masculino. No Egito Antigo, os faraós ostentavam força ao delinear os olhos com maquiagem preta e perfumar a pele com óleos essenciais. Já na Roma Antiga, apenas cidadãos influentes tinham o direito de se deixar imergir em banhos públicos aromáticos e dar um trato na pele com esfoliações à base de areia. Na vez do onipresente Luís XIV, o monarca francês que no século XVII se autoproclamava Rei Sol, ele batia os saltos altos no luxuoso piso do Palácio de Versalhes para colocar-se acima dos reles mortais, sempre com a cabeça adornada por generosas perucas e farta camada de pó de arroz na face. Com a chegada das revoluções burguesas, os homens abandonaram completamente o figurino, mudança que foi se acentuando até a chegada dos tempos em que esse tipo de cuidado era visto como uma afronta à masculinidade.

Até que veio o século XXI, era em que o papel do homem na sociedade passou a ser questionado e revisto, em pacote que inclui a derrocada de antigos preconceitos. Abriram-se então as portas para a vaidade e os cuidados com a beleza. Os números dão conta desta guinada: o interesse dos homens brasileiros por tratamentos e procedimentos estéticos vem subindo, e eles já compõem 30% da clientela — percentual seis vezes maior do que o registrado há apenas cinco anos, segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. A lista do que os preocupa ao se olharem no espelho também foi mapeada, encabeçada por queda das pálpebras, aumento da papada, formato do nariz e, claro, perda de cabelo. Não é um fenômeno local, de acordo com o instituto Grand View Research, que projeta um consistente crescimento no mercado global de beleza masculina, de 9% ano a ano, até 2030. “O homem moderno quer se cuidar para se apresentar no trabalho, na vida social, e estar bem para si mesmo”, afirma o cirurgião plástico André Maranhão, um dos profissionais mais conhecidos do Rio de Janeiro.

arte beleza masculina

O pelotão que busca lasers e bisturis o faz agora sem vergonha e gosta de falar disso, como o empresário Levi Chiocca, 32 anos. Vaidoso confesso, ele atenuou rugas com toxina botulínica, engatou em terapia para fortalecer o cabelo e submeteu-se a sessões com produtos biológicos e ultrassom microfocado para estimular a produção de colágeno. “Quero ter uma boa imagem e um visual saudável. Meu rosto vale um carro”, calcula. O mercado de trabalho vem sendo um dos motores para a alta na procura do variado leque de intervenções estéticas. É verdade que o mundo girou e muitos preconceitos se dissolveram, mas o ambiente corporativo segue associando a juventude a qualidades como dinamismo e capacidade para inovar. “A crença de que envelhecer diminui o valor profissional ainda está infelizmente presente, uma fonte de insegurança para muita gente”, lembra o psicólogo André Sena Machado, doutor em neurociências pela PUC-Rio.

As redes sociais, sempre elas, exacerbam a necessidade de sair bem na foto — este um lado que muitas vezes resvala para um terreno perigoso. “As redes amplificam a corrida por afirmação, dando peso à boa aparência”, explica o sociólogo Roberto Anunciação Antunes. Em doses saudáveis, porém, o movimento é mais do que bem-vindo e expressa o rompimento de velhos estereótipos de gênero. O homem moderno se aventura cada vez mais por territórios antes exclusivos do universo feminino, como moda e rotinas de cuidados variados com o rosto e o corpo — às claras e sem culpa nenhuma. “Eles estão visivelmente mais informados sobre os benefícios dos procedimentos e atentos às possibilidades no campo da estética”, afirma Simone Lima, especialista em harmonização facial.

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VAIDOSO, SIM - O empresário Levi Chiocca, 32 anos, investiu até agora valor equivalente ao de um carro em intervenções estéticas variadas. Foi por influência da mulher, médica da área, que ele desaguou nesse território. Acabou virando rotina. “Quero que ela tenha orgulho de estar ao lado de alguém que se cuida de verdade”, diz Levi, que garante: os investimentos em beleza dele vão seguir em alta
VAIDOSO, SIM – O empresário <strong>Levi Chiocca</strong>, 32 anos, investiu até agora valor equivalente ao de um carro em intervenções estéticas variadas. Foi por influência da mulher, médica da área, que ele desaguou nesse território. Acabou virando rotina. “Quero que ela tenha orgulho de estar ao lado de alguém que se cuida de verdade”, diz Levi, que garante: os investimentos em beleza dele vão seguir em alta./Arquivo pessoal

A libertação dos velhos escaninhos que definiam a masculinidade já se faz sentir por fases diversas da existência. Durante quase duas décadas, o empresário Marcos Casini, 62 anos, decidiu recorrer a aplicações regulares de Botox para levantar as pálpebras, até que optou pela solução definitiva do bisturi, ao completar 55. Passou mais tarde também por lifting labial e implante capilar. “A gente vai vivendo mais e se reinventa. Cuidar da aparência não tem idade nem gênero”, defende. Mas, como em toda linha evolutiva, algum estigma permanece. E, mesmo nos avançados dias de hoje, uma fatia dos representantes do sexo masculino ainda esconde a ida à clínica para dar aquela envernizada no visual, com receio de julgamentos quanto à própria masculinidade. “O medo é parecer supérfluo e dependente de artifícios para ganhar autoconfiança, algo visto como demonstração de fraqueza”, analisa o antropólogo Bernardo Conde. Aos poucos, no entanto, cada vez mais homens parecem dispostos a saltar de uma vez todas as barreiras, sem medo de ser felizes ao se olharem no espelho.

Publicado em VEJA de 25 de julho de 2025, edição nº 2954

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