Cristã, esposa, mãe de cinco filhos, e empresária — é assim que Márcia Gama escolhe se apresentar nas redes sociais, onde acumula mais de 350 mil seguidores. Entre mensagens religiosas e registros da rotina familiar, não faltam declarações afetuosas ao marido, o traficante Marcinho VP, e ao filho Mauro Nepomuceno, o rapper Oruam — ambos presos. O que ela esconde do público é bem menos inspirador: há mais de uma década, Márcia ocupa um cargo efetivo na Câmara de Vereadores de uma das cidades mais carentes da Baixada Fluminense, lugar onde, segundo funcionários, não pisa há anos.
Lotada desde 2011 como técnica jurídico-legislativa na Câmara Municipal de Belford Roxo, Márcia deveria cumprir expediente diário presencial. Para o serviço, recebe salário de 4.200 reais. Mas, segundo funcionários da Casa ouvidos por VEJA, ela não aparece no local de trabalho. “Faz mais de cinco anos que ela não vem aqui”, afirmou um funcionário, sob anonimato. “Ela não vai nem para assinar a folha”, explica.
Nas redes, em vez de atividades funcionais, Márcia exibe sua rotina como “personal washer” — nome pomposo dado ao serviço de lavanderia — e divulga peças da MMorena, sua loja de roupas femininas na Penha, Zona Norte do Rio.

A sustentação política que mantém seu cargo, apesar da ausência, vem de laços familiares. Cristiano Santos, ex-vereador do município, é irmão de Marcinho VP. Apesar de já ter sido preso por envolvimento com o tráfico no Complexo da Maré, Cristiano tem forte influência política na Baixada Fluminense. Atualmente, atua com mais força em São João de Meriti, cidade vizinha, onde outros membros da família Nepomuceno também ocupam cargos comissionados.
“O tráfico tem muita influência na política para poder circular nas comunidades sem ser incomodado. Por isso, é interessante para os políticos manterem o apoio da família do VP”, explicou um político da região à reportagem.