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Escalada

Havia tensão no governo e nas empresas com a guerra comercial global. Agora, predomina perplexidade com a perspectiva de destruição de riqueza. O acúmulo de contêineres sem destino nos portos nacionais permite um vislumbre das consequências de uma ofensiva mercantilista e perversa que, em duas semanas, pode levar ao colapso um fluxo de 100 bilhões de dólares anuais no comércio entre o Brasil e os Estados Unidos.

Nesse ambiente tóxico, a capacidade de resposta brasileira permaneceu limitada por uma combinação de improviso e imprevidência política com anemia econômica. Lula preferiu acreditar que as ameaças ao país no ano passado não passavam de tapeação eleitoral de Donald Trump.

Na fase de transição em Washington, resolveu restringir a comunicação às instâncias formais e inferiores da diplomacia, sem deixar espaço para outros canais de negociação com o novo governo. Nem se preocupou, na sequência, em traçar rotas alternativas para o país nesse novo mundo de confronto entre Estados Unidos e China, com fronteiras fechadas e guerra econômica contínua.

Deve-se à oposição a primeira iniciativa no Congresso Nacional para habilitar um sistema de proteção no comércio exterior, em resposta à política de “tarifas recíprocas” anunciada por Trump na posse. Quem fez foi a senadora Tereza Cristina, do Partido Progressistas (PP) do Mato do Grosso do Sul, ministra da Agricultura no governo Jair Bolsonaro. Ela emendou um projeto do senador Zequinha Marinho, eleito pelo Partido Social Cristão do Pará, onde se previa reciprocidade comercial baseada em padrões da política ambiental.

Lula demorou vinte semanas para sancionar a lei de defesa nacional no comércio exterior, aprovada em março no Senado e na Câmara. Só assinou depois que Trump amplificou a crise ao anunciar uma tarifa extraordinária (de 50%) em resposta ao julgamento da sua caricatura, Bolsonaro, por crimes contra a Constituição, entre eles o de tentativa de golpe de estado.

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“Trump abriu em Washington um inquérito com alvo em Brasília: Lula”

Nada indica que Trump conseguirá resgatar Bolsonaro do banco dos réus do Supremo Tribunal Federal com o seu programa de proteção a ditadores amigos, na fina ironia do economista Paul Krugman. Porém, o estrago está feito. Ele é grande e vai durar algum tempo — no mínimo, os próximos três anos e meio, tempo que resta a Trump na Casa Branca.

A boa notícia para o governo petista, no cenário de curto prazo sugerido pelas mais recentes pesquisas eleitorais, é que esse coquetel ruim de política externa com tarifas comerciais parece ter complicado ainda mais a vida de Bolsonaro, isolado um pouco mais os aliados na extrema direita, e, pode ter impulsionado a candidatura de Lula à reeleição.

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A má notícia para o Planalto é que Lula vai atravessar o ano e meio restante de mandato aprisionado na armadilha comercial de Trump. A tarifa alta pode até vir a ser reduzida, ainda assim seguirá a investigação aberta na semana passada contra o Brasil por supostas “práticas desleais” no comércio exterior.

É um procedimento jurídico e administrativo de longa duração e, essencialmente, punitivo. Como observam consultores da Eurasia, sinaliza que o governo dos Estados Unidos está decidido a impor ao Brasil tarifas mais altas, com a possibilidade de que no final a taxação permaneça em níveis proibitivos para uma variedade de produtos. Num exemplo, a tarifa já anunciada (50%) quando aplicada à Embraer resulta em custo adicional de 50 milhões de dólares por avião no chão da fábrica, segundo cálculos iniciais da empresa.

O inquérito comercial aberto em Washington é amplo o suficiente para permitir sanções ao Brasil pela reversão no Judiciário dos processos anticorrupção iniciados na Operação Lava-Jato. A USTR, agência responsável pela política comercial americana, argumenta: “Evidências sugerem que os esforços do Brasil para combater a corrupção enfraqueceram consideravelmente (…) Relatos indicam que promotores se envolveram em acordos obscuros para fornecer leniência a empresas envolvidas em corrupção e indicam conflitos de interesse em decisões judiciais.”

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Continua: “Em um caso amplamente divulgado envolvendo suborno de funcionários públicos para projetos públicos e lavagem de dinheiro, decisões de um juiz da Suprema Corte para anular as condenações atraíram críticas generalizadas. As evidências indicam que a falta de aplicação de medidas anticorrupção e a falta de transparência pelo Brasil podem prejudicar empresas americanas envolvidas em comércio e investimento no Brasil e levantam preocupações em relação às normas relativas ao combate ao suborno e à corrupção.”

É um inquérito em Washington com alvo em Brasília: Lula.

Os textos dos colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de VEJA

Publicado em VEJA de 18 de julho de 2025, edição nº 2953

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