Em balanço durante encerramento da Cúpula do Brics, nesta segunda-feira, 7, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o grupo foi fundado com objetivo de ser um outro modo de fazer política, de forma mais solidária, e não nasceu “para afrontar ninguém”. A fala segue anúncio do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre uma tarifa adicional de 10% aos membros do bloco, que ele acusou de sustentar “políticas antiamericanas”.
Segundo Lula, o Brics pode ser a “válvula de escapa que a humanidade precisa para fazer alguma coisa nova”.
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“Já somos 10 do G20. Falta só convidar os outros 10 para vir para o Brics, aí fica uma coisa só. Não precisa ter G7, ter G20, faz uma coisa só, que poderia ser a ONU, o grande centro de debates dos problemas mundiais. A ONU não é mais, e todo mundo sabe que não é mais”, disse.
Os países do Brics — originalmente composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, e recentemente expandido para incluir Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Indonésia e Irã — iniciaram uma cúpula de dois dias no domingo, no Rio de Janeiro. Os 11 países do grupo, além de dez parceiros comerciais, possuem um PIB agregado de 24,7 trilhões de dólares.
O grupo emitiu um comunicado que alfinetou as tarifas e a política externa do governo Trump, mas sem mencionar diretamente o presidente ou os Estados Unidos.
“Expressamos sérias preocupações com o crescimento de medidas unilaterais, tarifárias e não tarifárias, que prejudicam o comércio internacional e vão contra as normas estabelecidas pela OMC (Organização Mundial do Comércio)”, afirma um trecho da declaração final. Apesar de os Estados Unidos não serem mencionados nominalmente, pessoas próximas às negociações disseram que as críticas têm como alvo principal as ações de Trump, especialmente os tarifaços impostos durante sua gestão.
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Na noite de domingo, Trump ameaçou impor uma taxa adicional aos países que se alinharem às políticas dos países do Brics, após o grupo expressar “sérias preocupações” com a imposição de tarifas unilaterais.
“Qualquer país que se alinhe às políticas antiamericanas do Brics pagará uma tarifa ADICIONAL de 10%. Não haverá exceções a essa política”, disse em uma publicação na Truth Social, sua rede social. Ele não deu mais informações sobre quais nações seriam atingidas com a nova taxa e não explicou o que quis dizer com “políticas antiamericanas”.
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Declaração do Brics
No domingo 6, a cúpula de líderes do Brics divulgou uma declaração final que, embora condene os ataques recentes ao Irã, evita responsabilizar diretamente os Estados Unidos e Israel, principais autores das ofensivas contra o país persa. O texto optou por uma linguagem diplomática mais amena, suavizando a participação americana em conflitos recentes e evitando críticas à Rússia em relação à guerra na Ucrânia.
Na cláusula 21, a declaração “condena os ataques militares contra a República Islâmica do Irã desde 13 de junho de 2025”, classificando-os como violações do direito internacional e da Carta das Nações Unidas. “Expressamos profunda preocupação com a subsequente escalada da situação de segurança no Oriente Médio”. No entanto, os nomes de Israel e EUA não aparecem diretamente no texto – a crítica se limita a uma condenação genérica de ações contra a infraestrutura civil e instalações nucleares iranianas.
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O texto visa preservar a imagem do Brics para que fosse rotulado como anti-Ocidente ou contrário a Trump. Países como Índia, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e até o Brasil trabalharam para suavizar o tom exigido pelo Irã, que pressionava por uma responsabilização direta de Washington e Tel Aviv nos conflitos contra o país.
Sobre a guerra da Ucrânia, o documento final sequer a menciona ou faz algum tipo de censura à Rússia, silêncio que evidencia a cautela do grupo em confrontar Moscou, membro influente do Brics. A ausência de referências ao conflito reforça o equilíbrio buscado pelos líderes do bloco, que preferiram evitar tensões ao adotar uma abordagem mais genérica em sua declaração oficial.
As negociações, marcadas por divergências internas, deixaram claro os desafios trazidos pela expansão do Brics com a entrada de novos membros do Oriente Médio, cujas visões políticas sobre temas delicados, como Israel e Palestina, são bastante distintas. O texto final, contudo, reafirma o apoio do bloco à adesão plena da Palestina às Nações Unidas e à criação de dois Estados como saída para o conflito.
Embora mencione os termos “Israel” ou “israelense”, o comunicado oficial deixa de lado qualquer evidente responsabilização dos EUA e evita completamente o tema da guerra na Ucrânia, em clara tentativa de projetar uma imagem menos polarizada no cenário internacional classificado como “adverso” pelo presidente Lula, em discurso, mais cedo.