CHICAGO* – Pacientes que dependem de insulina, inclusive os que vivem com diabetes tipo 2, conhecem os impactos para a qualidade de vida do uso diário do medicamento, principalmente em relação à versão injetável: no mínimo, são 365 aplicações por ano, número que pode dobrar em alguns pacientes. Neste cenário, a insulina semanal tem despontado como uma opção para garantir o conforto sem impactar a eficácia do tratamento. Estudos apresentados durante a reunião anual da Associação Americana de Diabetes (ADA, na sigla em inglês), realizada neste mês em Chicago, reforçaram essa abordagem como segura e eficiente, além de uma frente adicional para o controle da doença que afeta 589 milhões de adultos no mundo.
Durante o evento, foram apresentados os ensaios de fase 3 com a insulina semanal em testes efsitora, desenvolvida pela farmacêutica Eli Lilly (a mesma do medicamento contra obesidade e diabetes Mounjaro), que demonstrou ter o mesmo perfil de segurança da versão diária e com capacidade de reduzir a hemoglobina glicada, índice de glicose dos últimos três meses que é uma das referências para diagnóstico da doença. Os achados foram publicados nos periódicos The New England Journal of Medicine e The Lancet.
A proposta dos trabalhos QWINT-1, QWINT-3 e QWINT-4, que avaliaram mais de 3 000 voluntários com diabetes tipo 2, era mostrar que o tratamento experimental não é inferior às drogas diárias atuais mesmo com o uso semanal. Os ensaios clínicos demonstraram equivalência entre elas no que diz respeito à redução do açúcar no sangue e com segurança para os pacientes.
Nos testes que duraram um ano (52 semanas), a efsitora reduziu a hemoglobina glicada em 1,31% contra 1,27% da insulina glargina. Nos ensaios de 26 semanas, a diminuição foi de 0,86% com efsitora e de 0,75% com insulina degludeca e ficou em 1,07% tanto com a efsitora quando com a insulina glargina.
“Um regime semanal mais simples pode ajudar essas pessoas a iniciar e manter o tratamento, com o objetivo de melhorar os níveis de glicose no sangue. Em todos os estudos QWINT, a efsitora demonstrou controlar a glicemia com a mesma eficácia que as insulinas basais diárias mais utilizadas”, afirmou um dos autores do estudo, Julio Rosenstock, professor clínico de medicina no University of Texas Southwestern Medical Center.
Com esses resultados, a Lilly planeja submeter a efsitora às agências reguladoras globais para o tratamento de adultos com diabetes tipo 2 ainda neste ano.
Benefícios da insulina semanal
O endocrinologista Luís Henrique Canani, professor titular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), tem acompanhado as pesquisas com insulina semanal e afirma que os achados são essenciais para o bem-estar das pessoas que vivem com diabetes.
De forma simplificada, ele explica que o ser humano produz dois tipos de insulina: a basal, que tem produção contínua, e outra de ação rápida desencadeada quando nos alimentamos. O paciente com diabetes apresenta falhas na produção de insulina, hormônio que regula os níveis de açúcar no sangue, o que faz com que o tratamento seja necessário.
O problema é que a aplicação pode ser necessária até duas vezes por dia, dependendo do caso. “Estamos falando de sair de 730 aplicações para 52 em um ano em pessoas que já precisam medir a glicemia com picadas na ponta do dedo. Isso muda a vida delas por reduzir o peso emocional e físico do tratamento.”
Canani coordenou um dos grupos que avaliou voluntários brasileiros em testes com a primeira insulina de uso semanal, a icodeca (Awiqli, da Novo Nordisk) — aprovada no Brasil em março deste ano pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mas sem data prevista para chegada ao país — em comparação à dose diária de insulina degludeca.
Os resultados do ensaio ONWARDS 3 foram animadores: após 26 semanas, a insulina semanal levou a uma redução superior da hemoglobina glicada com menos eventos adversos, entre eles, a hipoglicemia (queda de açúcar no sangue).
Segundo o pesquisador, a tendência dos próximos estudos com a insulina semanal é esmiuçar seus benefícios para outros grupos que vivem com a doença, não apenas adultos com controle inadequado da glicemia.
“As pesquisas vão abordar outros recortes: paciente mais magro, com obesidade e mais tempo de diabetes”, exemplifica.
Enquanto essas versões não se popularizam, quem vive com diabetes não pode se esquecer de manter o tratamento e fazer o acompanhamento correto dos índices de açúcar no sangue. As novas tecnologias vão trazer qualidade de vida, mas os estudos também servem para reforçar que os tratamentos atuais são eficazes e evitam as graves complicações do diabetes, como cegueira, doenças cardiorrenais e amputações.
*A repórter viajou a convite da Novo Nordisk