Escândalos de corrupção são parte de uma triste rotina nacional, mas alguns ainda conseguem surpreender pela dimensão, pelo quilate dos personagens envolvidos, pela ousadia e também pela crueldade. Em abril, a Polícia Federal desvendou um esquema que desviou cerca de 4 bilhões de reais dos aposentados do INSS. Empresários, sindicalistas e servidores públicos montaram uma rede criminosa que, entre outras barbaridades, se aproveitava da fragilidade e da boa-fé dos idosos para induzi-los a autorizar descontos em suas já minguadas pensões. Das entidades envolvidas na trama, duas chamaram atenção: a poderosa Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), uma parceira histórica dos governos petistas, e o Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi), que tem como vice-presidente José Ferreira da Silva, irmão do presidente Lula. O Congresso instalou uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para apurar o caso. Preso, o lobista Antônio Carlos Camilo Antunes, conhecido como “Careca do INSS”, foi apontado como o operador da quadrilha, um dos mentores da fraude e guardião de alguns segredos. Fora isso, as investigações não avançaram muito.
Em maioria na comissão, deputados e senadores governistas conseguiram impedir a convocação do irmão do presidente. O Sindnapi arrecadou 390 milhões de reais mediante descontos ilegais nas aposentadorias entre 2021 e maio deste ano. Em outra frente, a bancada governista também se uniu para rejeitar a convocação do advogado Paulo Boudens. Relatórios de inteligência financeira revelaram que ele recebeu 3 milhões de reais de uma empresa ligada ao “Careca do INSS”. O advogado é consultor do Senado, ex-assessor e braço direito do presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP). De acordo com a Polícia Federal, a empresa pagadora era usada pelo grupo criminoso para lavar o dinheiro roubado dos aposentados e para repassar propinas e comissões aos envolvidos na fraude — inclusive, suspeita-se, a políticos que compactuariam com o golpe. O relatório final da CPMI deve ser conhecido em março de 2026.
Publicado em VEJA de 24 de dezembro de 2025, edição nº 2976