Diego Rivera (1886-1957) e sua companheira Frida Kahlo (1907-1954) foram testemunhas da riqueza de Detroit na década de 1930. O casal mexicano viveu por alguns meses ali, a convite da família Ford, que encomendou ao artista uma série de murais para retratar o setor produtivo automobilístico e seus colaboradores. A obra-prima monumental, instalada no Detroit Institute of Arts, tornou-se um marco do capitalismo industrial. Quase um século depois, a arte continua encantando moradores e turistas, enquanto a área tenta recuperar o protagonismo de sua época de ouro.
Má administração e corrupção, ascensão das montadoras japonesas, êxodo da população para os subúrbios e agravamento da violência urbana causaram um colapso econômico que levou à falência de Detroit, em 2013, a maior já registrada nos Estados Unidos (a dívida era estimada em mais de 18 bilhões de dólares). O que foi símbolo de progresso virou cenário de abandono e decadência. Segundo estimativas do U.S. Census Bureau de 2024, existem 645 mil habitantes, uma queda significativa em relação ao auge de 1,8 milhão em 1950. Mas isso está mudando. Para Daniel Toledo, advogado especialista em direito internacional, há brasileiros se mudando para a região com emprego garantido e vistos aprovados. “Tenho visitado a cidade nos últimos vinte anos e a transformação é evidente, mudou muito”, afirma o profissional, que atende clientes interessados em imigrar legalmente para os Estados Unidos.
Segundo ele, essas pessoas não chegam para procurar trabalho: já vêm contratadas do Brasil, após passarem por processo seletivo, com contrato assinado e visto autorizado pela empresa.
A recente atratividade da Motor City (Cidade do Motor) é uma combinação de investimentos sociais, recuperação do seu forte legado e fábricas buscando entrar na era da transformação digital.
Em maio deste ano, a metrópole foi escolhida pela Siemens, gigante alemã de tecnologia, para hospedar a Realize Live Americas, conferência que reuniu mais de 2.500 profissionais das áreas de engenharia, design e TI. O encontro divulgou casos reais de adoção de gêmeos virtuais, PLM em nuvem (product lifecycle management, ou seja, gestão de todo o ciclo de vida de um produto, desde a concepção até o descarte), inteligência artificial industrial e automação, usando as soluções da empresa.
A startup Arc Boat, de Los Angeles, levou o barco elétrico de alta performance Arc One para dentro do espaço da conferência realizada no centro de Detroit. O modelo de luxo tem motor de 500 hp, atinge até 40 mph e autonomia de 5 horas.
Desenvolvido por Mitch Lee, ex-Tesla, e Ryan Cook, ex-SpaceX, o produto é sustentável, com preço inicial de 268 mil dólares. A Workhorse, de Ohio, que fornece veículos para UPS e FedEx, apresentou o caminhão a bateria W56, com zero emissão de poluentes. A britânica BAC (Briggs Automotive Company) reduziu em 30% o tempo de desenvolvimento de automóveis esportivos personalizados por meio de gêmeos virtuais e ambientes imersivos. Já a startup finlandesa Spinnova chamou atenção com uma fibra têxtil feita de madeira e resíduos, livre de químicos e que consome 98% menos água, adotada pela fabricante de tecidos e roupas Marimekko.
A Stoneridge, líder em sistemas eletrônicos para mobilidade, escolheu a plataforma Siemens Xcelerator para unificar seus processos de engenharia. A iniciativa reduziu o tempo de desenvolvimento em 25% e economizou US$ 200 mil em investimentos. A Northrop Grumman mostrou como a simulação e a prototipagem digital estão acelerando projetos espaciais e tornando os sistemas de lançamento de foguetes e equipamentos mais leves e eficientes. Gigante americana do setor aeroespacial e de defesa, a empresa é conhecida pelo avião bombardeiro B-21 Raider e possui receita superior a US$ 40 bilhões. Além disso, desenvolve tecnologias para a NASA, incluindo o satélite Cygnus.
Tony Hemmelgarn, presidente da Siemens Digital Industries Software, justificou a escolha de Detroit para o evento: “Nossos principais clientes como Ford e General Motors estão aqui, mas o desafio é trabalhar com startups e empresas pequenas e médias, acompanhar o crescimento de todos”, e adiantou, “em cinco anos, todo o mercado estará profundamente transformado por tecnologias como inteligência artificial, computação quântica e eventualmente, fusão nuclear.”