Foi nesta sexta, 5. No dia em que Jair Bolsonaro, preso, inelegível e condenado por tentativa de golpe, finalmente admitiu o óbvio: não será candidato em 2026. E, ao admitir, empurrou o próprio filho para o centro do tabuleiro. Flávio Bolsonaro é agora o nome escolhido para liderar a chapa da direita no próximo ano. A confirmação muda o jogo — e a disputa interna no grupo começa agora.
Não é surpresa. Na minha coluna “A curiosa conclusão de aliados de Lula sobre o futuro de Bolsonaro”, publicada meses atrás, eu já registrava o movimento: a direita poderia optar por um Bolsonaro na cabeça de chapa para preservar a marca, mesmo sem Jair. Agora será Bolsonaro 22 nas urnas contra Lula 13 igual na última eleição. Aqueles aliados de Lula, que acompanham o bolsonarismo de lupa na mão, já percebiam o que finalmente se materializou.
E por isso é decisivo? Porque faltava um nome. Tarcísio de Freitas despontava como opção natural, mas sempre esperou pela benção do capitão. Romeu Zema nunca empolgou de verdade fora de Minas. Ratinho Júnior é também forte regionalmente, mas não nacionalmente. Ronaldo Caiado, por sua vez, dizia que seria candidato — mas nunca teve uma ponte sólida com o eleitorado bolsonarista raiz.
A pergunta que atravessava o campo da direita era simples: quem carrega o “espólio”? A resposta veio com o peso do sobrenome.
Flávio Bolsonaro chega à disputa com a força simbólica de “ser um Bolsonaro”. E isso importa muito. Em 2022, Jair perdeu por pouco. O recall do número 22 e do nome cravado no topo da urna segue vivo na cabeça de milhões de eleitores. É exatamente essa memória eleitoral que a campanha tentará reativar agora.
Os governadores: e agora?
Para Tarcísio de Freitas, a equação se resolve rapidamente: com a derrota interna, tende a disputar a reeleição em São Paulo. Era o mais cotado para substituir Jair, mas jamais demonstrou apetite real pelo confronto nacional. Volta à rota natural.
Ronaldo Caiado repete publicamente que mantém sua pré-candidatura. Internamente, sua equipe afirma que nada muda: ele continua no páreo. Mas a pressão para se acomodar como aliado — ou até como vice — vai se intensificar.
E aí entram Romeu Zema e Ratinho Júnior. Ambos podem ser empurrados para a disputa pela vice que se abre com a entrada de Flávio. É uma batalha que começa imediatamente: quem do grupo será “o moderado” capaz de ampliar o eleitorado bolsonarista sem ofuscar o herdeiro?
A escolha de Flávio oferece uma vantagem inegável: continuidade simbólica. Com o patriarca fora da urna, a marca Bolsonaro precisava de um rosto. O filho mais velho cumpre esse papel.
Além disso, o time bolsonarista aposta pesado na repetição do número 22 e no poder do sobrenome no topo da chapa. É simples, mas eficiente. Em uma eleição polarizada, memória vale voto.
Os contras — e são muitos
Mas há riscos. E não são pequenos.
Flávio não chega “limpo”. Rachadinhas, imóveis, negócios controversos. Brasília inteira comenta: ele tem telhado de vidro. Muito vidro. E em campanha presidencial, o holofote não perdoa. Tudo volta, tudo reaparece, tudo vira munição.
Outro ponto: Jair Bolsonaro, mesmo preso, continuará sendo o principal cabo eleitoral do próprio filho. Isso fortalece o núcleo duro do bolsonarismo — mas afasta moderados, centro-direita e conservadores independentes que já demonstraram fadiga com o radicalismo que levou à trama golpista.
E há uma comparação inevitável: de um lado, Flávio, senador com trajetória política menos conhecida. Do outro, Lula, presidente no terceiro mandato e com vasta musculatura política. Não será um embate entre iguais.
Favoritismo de Lula
E aqui entra o fator mais silencioso do jogo. Na minha coluna “O impacto silencioso que explica o favoritismo de Lula”, escrevi que a economia — melhoria de renda, emprego em alta, isenção do IR até R$ 5 mil — criou uma base sólida para o atual presidente. Lula disputa 2026 com entregas concretas para mostrar.
Com a direita mergulhada em sua reestruturação — e agora subordinada ao sobrenome Bolsonaro — Lula navega com vantagem real. Não é favoritismo só de pesquisa: é favoritismo de contexto.
A oficialização de Flávio na cabeça de chapa não resolve o problema da direita. Resolve apenas um pedaço. Evita um vazio. Evita a implosão que viria se Jair insistisse na fantasia de ser candidato. Mas é uma aposta de alto risco.
De um jeito ou de outro, o movimento escancara o que já estava claro: a direita brasileira, hoje, é menos um projeto político — e mais um sobrenome tentando sobreviver.