No alto da Tavares Bastos, comunidade da Zona Sul do Rio de Janeiro, onde o horizonte paradisíaco abraça o morro, nasce uma experiência de olhar aguçado e detalhista, a partir do fotojornalista Severino Silva, “cria” daquela localidade. A exposição fotográfica intitulada Imagens do Beco, convida o público a mergulhar em um território que pulsa arte, memória e identidade. A mostra, programada para acontecer no próximo dia 13, sábado, promete transformar a favela em uma autêntica galeria a céu aberto.
Mais do que uma mostra de imagens, o projeto é uma espécie de abraço coletivo – uma celebração da periferia que se vê, se reconhece e se afirma como espaço de beleza e expressão. Ao todo, pelo menos 50 fotos, voltadas para diversos temas, sobretudo religião e cotidiano, vão expor a percepção única de Severino. São retratos que já deram à luz, ao longo de sua carreira, não só à grandes reportagens, mas também à poesia das vielas, ao colorido das moradias e aos rostos que contam histórias de força, esperança, dor, alegria e luta, de quem vive nas comunidades da capital fluminense.

Idealizador da iniciativa, junto com o amigo Jardel Brito, especialista em audiovisual, Severino Silva destaca o caráter transformador da proposta, que promete se repetir posteriormente, com fotografias produzidas por moradores da própria comunidade e por outros fotógrafos cariocas já consagrados, mesclando conhecimentos e experiências.
“É uma alegria imensa poder liderar esse projeto inédito, que nasce do coração da comunidade e para ela. Tenho certeza de que essa exposição vai movimentar a cultura do morro, mas, principalmente, e essa é minha intenção, servir de exemplo para inspirar novos talentos, e mostrar a cariocas e turistas, que arte também floresce onde muitos, infelizmente, não esperam”, afirma Severino Silva.
Mais do que um evento cultural, Imagens do Beco é um gesto de resistência e resiliência – um convite a ver e sentir a favela com outros olhos. A expectativa dos moradores é que o evento seja um histórico encontro entre arte e território, onde cada imagem carrega o pulsar da comunidade.
“Será, sobretudo, a celebração da identidade periférica. Porque quando o morro se revela, o Rio inteiro aprende a enxergar diferente”, avalia Severino.
No dia 13, a exposição será aberta às 13h, no final da Rua Tavares Bastos, no ponto final das kombis. Neste dia, a mostra poderá ser vista até a meia-noite. Guias da comunidade vão auxiliar visitantes a chegarem à galeria urbana, onde haverá também projeção de fotos em um telão e recortes de jornais.

Um dos maiores do Brasil
Com uma trajetória marcada pela sensibilidade e pela verdade do olhar, Severino Silva é um dos fotógrafos documentais mais respeitados do Brasil e do mundo. Sua trajetória ganhou destaque internacional, quando a revista National Geographic o apontou como um dos maiores fotógrafos de comunidades do Planeta, ressaltando sua capacidade singular de narrar, especialmente , por meio da imagem, histórias de dor, afeto e dignidade.
Com carreira marcada por mais de três décadas de atuação, tornou-se referência na cobertura de polícia, direitos humanos e cotidiano das comunidades do Rio de Janeiro e coleciona prêmios, justas recompensas pela sua brilhante trajetória profissional. Tido ainda como um dos principais fotógrafos que cobrem crimes no Brasil pelo jornal “The Guardian”, Severino relembra de fotos históricas, como a que levou a ganhar o Prêmio Vladmir Herzog. Na verdade , uma sequência de fotos dramáticas, do flagrante de um jovem, sem os braços, fugindo da ação de agentes do município e do estado, que combatiam o crack na Zona Norte da capital carioca.
“É triste, é doloroso, mas a gente tem que mostrar tudo isso à sociedade. É uma missão”, relatou Severino ao The Guardian.
Paralelamente ao seu trabalho, o fotógrafo dedica-se ao projeto pessoal “Fé, Luz e Sombras”, ambientado no Rio e no Nordeste brasileiro, em que retrata a religião dentro de um jogo de luminosidade clara e escura.
Sobre a comunidade Tavares Bastos
Localizada entre os bairros do Catete e Laranjeiras, na Zona Sul do Rio de Janeiro, a Tavares Bastos, com cerca de 10 mil moradores, é uma das comunidades mais emblemáticas da cidade. Conhecida por sua vista panorâmica e por abrigar o Batalhão de Operações Especiais (Bope), uma das unidades de polícia pioneiras do Estado do Rio, o morro também se destaca pela forte presença cultural e pela convivência harmoniosa entre moradores antigos e novos artistas que encontram ali inspiração e incentivos.
Com ruas estreitas, vielas cheias de vida e um espírito comunitário vibrante, a Tavares Bastos tornou-se símbolo de criatividade. Entre lajes, becos e muros coloridos, floresce uma cena cultural própria — onde a arte, a música e a fotografia transformam o território em um verdadeiro laboratório de expressões e identidades. E é nesse ambiente de contrastes, que a exposição Imagens do Beco promete atrair atenção e olhares de todo o mundo.