Um novo estudo global, liderado pela Pew Charitable Trusts em parceria com acadêmicos de instituições como a Imperial College London e a University of Oxford, revela que a poluição gerada por embalagens plásticas, equivalente hoje a 66 milhões de toneladas por ano, pode ser quase eliminada até 2040.
Se nada for feito, a poluição plástica global deve mais que dobrar até 2040, chegando a 280 milhões de toneladas por ano — o equivalente a “um caminhão de lixo cheio de plástico sendo despejado a cada segundo”.
Mas o relatório afirma que, com a adoção em larga escala de esquemas de reuso e retorno (por exemplo, consumidores levarem embalagens vazias ou copos reutilizáveis a supermercados e cafés), combinados com redução da produção de plásticos para embalagens, substituição por outros materiais (vidro, metal, papelão) e proibição de certos polímeros, seria possível reduzir a poluição por embalagens em até 97% em 15 anos.
Os autores do estudo defendem que a comunidade global tem “a habilidade de transformar o sistema plástico e resolver o problema da poluição em uma geração”, desde que os tomadores de decisão reconheçam a urgência e priorizem “pessoas e planeta” sobre o lucro.
Por que o plástico se tornou uma ameaça global
Segundo o estudo, a produção global de plástico, hoje impulsionada em grande parte pelo setor de embalagens, deve saltar de 450 milhões de toneladas para 680 milhões de toneladas até 2040. Isso representa um crescimento muito mais acelerado do que a capacidade dos sistemas de gestão de resíduos no mundo.
O problema vai além do lixo visível: plásticos contêm mais de 16 mil substâncias químicas adicionadas intencionalmente, além de contaminantes não intencionais.
A exposição humana, seja por contato direto, ingestão ou contaminação ambiental, já foi associada a vários efeitos negativos. Entre eles, desregulação hormonal, fertilidade reduzida, baixo peso ao nascer, alterações cognitivas em crianças, diabetes e fatores de risco para doenças cardiovasculares e câncer.
Além disso, o setor plástico contribui fortemente para as emissões globais de gases de efeito estufa: as emissões associadas à produção e descarte de plástico devem subir de 2,7 gigatoneladas de CO₂ equivalente (GtCO₂e) atualmente para 4,2 GtCO₂e em 2040, o que colocaria a “indústria do plástico” como o terceiro maior emissor global, atrás apenas de países como China e EUA.
Por que o Brasil importa
O Brasil figura como o maior poluidor da América Latina quando o assunto é plástico descartado no oceano. São aproximadamente 1,3 milhão de toneladas de plástico por ano lançadas no mar, volume que corresponde a cerca de 8% da poluição plástica oceânica global.
Estudos recentes mapeiam 600 grandes pontos de descarga plástica no litoral brasileiro, de norte a sul, especialmente nas bacias dos rios mais expressivos e em regiões densamente povoadas e costeiras.
Contaminação do litoral e microplásticos no litoral brasileiro
Pesquisas nacionais detectaram microplásticos, partículas plásticas menores que 5 milímetros, em praticamente toda a costa brasileira. No litoral sul, por exemplo, um estudo da PUCRS em 2025 encontrou média de 650 partículas de microplástico por quilograma de areia na praia de Torres (RS).
Essas partículas representam risco real à fauna costeira e podem entrar na cadeia alimentar, com implicações também para a saúde humana.
Impactos sobre fauna marinha e costeira
A poluição plástica já causa efeitos severos na fauna marinha brasileira: aves, peixes, tartarugas, mamíferos marinhos e invertebrados são afetados pela ingestão de resíduos plásticos ou pelo emaranhamento.
Um estudo focado na costa do Rio de Janeiro revelou que tartarugas-verdes que vivem na região sofrem ingestão de detritos plásticos com frequência, evidência de que o problema não é apenas remoto, mas local e real.
Além disso, um alerta recente feito por um estudo coordenado pela Fiocruz Amazônia e pelo Instituto Mamirauá registrou contaminação por plástico, de macro a nanoplasticos, em ambientes aquáticos e terrestres da Amazônia.
O problema atinge também sedimentos, água, fauna e flora e expõe populações ribeirinhas e indígenas a riscos de saúde, já que muitas comunidades dependem desses ecossistemas para alimentação e abastecimento hídrico.
Outro estudo sobre o rio Amazonas demonstrou que plantas aquáticas (macrófitas) estão retendo partículas plásticas, o que revela a capacidade de micro e nanoplásticos de se dispersarem e se acumularem em ecossistemas de água doce, não apenas no litoral.
O que está em jogo no Brasil
– A baixa taxa de reciclagem de plástico no Brasil agrava o problema: segundo levantamento citado por pesquisadores, apenas 1,3% do plástico produzido no país é reciclado.
– Com o contínuo despejo de plástico no oceano e nos rios, biomas essenciais, costeiros, marinhos, rios amazônicos ficam sob risco constante de degradação. Isso implica perda de biodiversidade, ameaça a espécies nativas e danos aos modos de vida tradicionais.
– A contaminação por micro- e nanoplásticos significa que o problema não é só visível. Substâncias plásticas entram na água, nos sedimentos, na biota e podem chegar ao ser humano via alimentação, o que agrava riscos à saúde pública.
– Considerando o aumento global da produção de plástico, se não houver mudança de paradigma (produção, consumo e descarte), o Brasil corre o risco de ampliar seu legado como grande exportador de poluição para suas costas e interior fluvial.
O panorama traçado pelo estudo global da Pew, de que reuso e retorno podem reduzir drasticamente a poluição, faz sentido também no contexto brasileiro.
A elevada produção de descartáveis, o baixo índice de reciclagem, a recorrente poluição costeira e fluvial e os impactos já documentados sobre fauna e comunidades tradicionais mostram que o Brasil não está imune ao problema.
Adotar sistemas de reuso e retorno (garrafas e embalagens retornáveis, copos reutilizáveis, estações de recolhimento, incentivos à reutilização), combinado com políticas públicas que restrinjam plásticos descartáveis e promovam materiais alternativos, poderia reduzir drasticamente a poluição plástica, proteger ecossistemas marinhos e de água doce.
Mas, para isso, é essencial que governos, setor privado e sociedade civil atuem conjuntamente.