O desemprego a 5,4%, à primeira vista, é o sonho de qualquer governo: menos gente desempregada, mais gente ocupada – a população desocupada recuou para 5,9 milhões de pessoas, o menor contingente já registrado na história. Mas … sempre tem um mas… basta olhar alguns dados com lupa para a euforia perder força.
Tem mais gente ‘fora do jogo’. Menos desempregado e menos trabalhador tentando entrar.
A taxa de participação, que mede quantos, em idade de trabalhar, estão efetivamente na força de trabalho, caiu de 62,5%em 2024 para 62,1% em 2025. Parece pouco, mas num país de mais de 200 milhões de habitantes, isso significa mais gente deixando de procurar ocupação.
O grupo que o IBGE chama de “população fora da força de trabalho” — quem nem está empregado nem busca vaga — cresceu para 66,1 milhões de pessoas, aumento de 425 mil em relação ao trimestre anterior e de 1,2 milhão frente a 2024.
É aí que entram em jogo as dúvidas sobre desalento, benefícios sociais, informalidade e o futuro do emprego no Brasil.
Galípolo: ‘Difícil’
O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, reconheceu o dilema. De um lado, uma taxa de desemprego tão baixa que é difícil contestar a ideia de mercado “aquecido”. De outro, sinais confusos vindo das estatísticas.
“Não tem sido simples fazer análise do mercado de trabalho, essa que é a verdade”, admitiu. Ele falou em “sinais mistos”, correlações que deixaram de funcionar como antes e uma economia que continua “forte, aquecida e resiliente do ponto de vista da demanda”.
Diante dessa nebulosa, a conclusão do BC é clara: se errar, vai errar pelo lado da cautela. Se não entende bem todos os mecanismos que estão por trás de um dado bonito, o remédio é manter a Selic alta por mais tempo.
“Na dúvida, o papel do Banco Central é ser um pouco mais conservador”, disse Galípolo, reforçando que o Copom não tem “obrigação” de telegrafar os próximos passos da política de juros.
E o Bônus demográfico?
Para o economista Ricardo Rocha, coordenador de Finanças do Insper, o ponto mais preocupante não é o desemprego em si, mas a queda na taxa de participação e o aumento do desalento.
Ele lembra que, quando a pessoa deixa de procurar emprego, pode estar acontecendo uma de duas coisas — ambas ruins para o médio prazo: Perda de esperança – o trabalhador simplesmente não acredita que vai conseguir vaga; E renda “alternativa”: benefícios sociais ou arranjos informais que garantem um mínimo de sobrevivência sem vínculo formal.
Rocha chama atenção para o que está em jogo:
- o Brasil está perdendo o bônus demográfico — aquela janela em que a população em idade ativa é maior que a de dependentes;
- jovens fora da força de trabalho deixam de acumular experiência, qualificação e renda;
- quando essa geração chegar aos 30, 35 anos, corre o risco de estar defasada num mercado cada vez mais tecnológico.
Ele também aponta o risco de políticas de transferência de renda mal calibradas: necessárias para reduzir pobreza, mas, se mal desenhadas, podem desestimular a busca por emprego formal, especialmente quando somadas a uma estrutura tributária que encarece a contratação.
Já Marcus Labarthe, sócio-fundador da GT Capital, reforça outro lado da estatística: o da informalidade e do “empreendedorismo por necessidade”.
Na leitura dele, os números da PNAD estão contaminados por três vetores: Benefícios sociais (como Bolsa Família e outros auxílios) recebidos por milhões de pessoas; Trabalhadores que preferem não ter carteira assinada para não perder o benefício; Brasileiros que se viram empurrados para o bico e o subemprego, e entram nas estatísticas como ocupados — ainda que em condições precárias.
O resultado é um mercado que parece robusto na fotografia, mas esconde muita fragilidade:
“O brasileiro é empreendedor, sim, mas muitas vezes é obrigado a ser empreendedor porque o mercado não oferece vagas formais”, lembra Labarthe.
Para ele, num ambiente em que o governo pisa no acelerador da economia, enquanto o Banco Central freia com juros altos, a leitura do emprego fica ainda mais distorcida. E toma decisões de política monetária olhando apenas para a taxa de desemprego pode ser enganoso.
Galípolo, Rocha e Labarthe parecem convergir em um ponto: olhar só a taxa de desocupação não basta para entender o mercado de trabalho brasileiro em 2025.
Por trás do recorde histórico, há um país em que mais gente está saindo do jogo — e isso cobra a conta lá na frente, na produtividade, no crescimento e na própria capacidade da economia de gerar empregos decentes quando, enfim, os juros começarem a cair.