Teerã, capital política e econômica do Irã, vive uma crise hídrica que ganhou contornos dramáticos em 2025, ao ponto de autoridades alertarem que a cidade inteira pode se tornar inabitável nas próximas semanas se não chover.
Com mais de 10 milhões de habitantes na área urbana e cerca de 18 milhões na região metropolitana, o temor é que a metrópole se aproxime do temido “zero absoluto” de água.
O presidente Masoud Pezeshkian chegou a declarar que, se a chuva não retornar até o fim do ano, o governo terá de começar a racionar e, caso o abastecimento não se normalize, que “não sobrará água” e talvez seja necessário evacuar Teerã.
Barragens secas, torneiras vazias
Todas as barragens que abastecem Teerã, incluindo a maior delas, Amir Kabir Dam, estão com volumes críticos. O reservatório, que no ano passado guardava cerca de 86 milhões de metros cúbicos de água, hoje está com 10% da capacidade, suficiente para atender a cidade por apenas mais algumas semanas.
Fontes oficiais já admitem cortes extensos no abastecimento: há relatos de torneiras secas à noite em várias regiões da capital. A situação se agrava porque 2025 é o ano com a pior seca em um século nessa região do Oriente Médio. E uma parte significativa do país, incluindo cerca de metade das províncias, não registra precipitação há meses.

“Falência hídrica”: mais do que seca, um colapso sistêmico
Especialistas e autoridades não veem a crise atual como consequência apenas da falta de chuva. Eles apontam que décadas de má gestão dos recursos hídricos, com a construção de numerosas barragens, exploração desenfreada de aquíferos, irrigação excessiva e infraestrutura insuficiente, deixaram o sistema vulnerável.
O resultado: um processo chamado por analistas de “falência hídrica”. As reservas superficiais secaram, os aquíferos estão esgotados, e mesmo uma boa temporada de chuvas provavelmente não seria suficiente para restaurar o equilíbrio perdido.
Além disso, a urbanização acelerada, crescimento populacional e aumento desigual do consumo intensificaram a pressão sobre um sistema que já operava no limite.
As consequências sobre a vida de milhões
Para os moradores, a crise já é uma realidade cotidiana. Moradores relatam torneiras secas por horas ou dias, supressão de água à noite, incerteza sobre quando voltará o abastecimento e medo de chegar ao ponto em que o fornecimento será interrompido por completo.
O risco não é apenas técnico, mas social. A escassez pode provocar migrações internas, com famílias buscando refúgio em regiões menos afetadas, e gerar tensões, especialmente em áreas periféricas que dependem de caminhões-pipa ou fontes alternativas.
Também há impacto econômico e ambiental: agricultura irrigada, indústria, saneamento e serviços públicos dependem de água; com a crise, tudo fica fragilizado. E o atraso em políticas de longo prazo limita respostas estruturais.

Por que extremos como esse estão se tornando mais comuns
A crise de Teerã insere-se num contexto global. O que antes eram eventos raros de seca e escassez agora são uma nova normalidade em megacidades, resultado da conjunção entre mudança climática e gestão insustentável de recursos.
O aquecimento global altera padrões meteorológicos, reduz precipitação em regiões vulneráveis e aumenta a evaporação de solo e reservatórios, clássico gatilho para secas mais severas.
Além disso, sistemas construídos sem visão de longo prazo, barragens, uso intensivo de aquíferos, irrigações intensas, tornam regiões áridas ainda mais suscetíveis.
No caso do Irã, a estratégia histórica de autossuficiência agrícola e irrigação extensiva em áreas semiáridas consumiu rios e aquíferos. Com a repetição de anos de estiagem, o colapso deixou de ser apenas provável: virou iminente.
Esse padrão não é exclusivo do Oriente Médio. Várias regiões do planeta, inclusive no Brasil, vivem crises semelhantes. As lições de governança, planejamento e adaptação agora são uma questão de sobrevivência.

Evacuação: alarme real ou retórica política?
O anúncio sobre possível evacuação de Teerã, feito pelo presidente iraniano, chocou o mundo e gerou debates acalorados. “Se não chover, teremos de racionar; se não bastar, teremos de evacuar”, afirmou, em declaração que evidencia o clima geral de pânico que se espalha pela capital.
Para especialistas do país, porém, a evacuação é um gesto de pressão e aviso à população. Levantar uma operação de retirada de dezenas de milhões de pessoas, num país já sob forte crise econômica, exigiria uma logística enorme, infraestrutura de acolhimento e recursos que parecem hoje fora de alcance.
É provável, dizem, que o governo opte por medidas intermediárias: racionamento rígido, cortes programados, campanhas públicas de economia de água, restrições de uso doméstico e industrial, tentativas de chuva artificial, como semeadura de nuvens, embora com eficácia científica controversa.

O dilema estrutural e o alerta para o mundo
A crise de Teerã entrega uma lição dura: megacidades construídas em regiões áridas, que dependem de barragens, irrigação intensa e aquíferos profundos, são extremamente vulneráveis em cenários de seca prolongada.
E a mudança climática torna mais frequentes esses extremos, o que exige planejamento de longo prazo, adaptação e reconfiguração de modelos urbanos sustentáveis.
Para evitar que Teerã se torne um precedente sombrio, serão necessárias mudanças profundas: gestão racional da água, revisão da agricultura irrigada, investimentos em infraestrutura de saneamento, uso eficiente, reciclagem e reutilização de água, além de políticas sociais que assegurem acesso digno e equitativo ao recurso.