counter Zeca Veloso a VEJA: ‘Estou mais do lado dos críticos ao nepotismo’ – Forsething

Zeca Veloso a VEJA: ‘Estou mais do lado dos críticos ao nepotismo’

Nesta quarta-feira, 26 de novembro, Zeca Veloso enfim deu o passo mais largo de sua carreira musical: lançou um disco composto por dez faixas inéditas, Boas Novas, após anos de singles esporádicos. Seguindo os passos do pai — o incontornável Caetano —, da tia Maria Bethânia e dos irmãos Moreno e Tom, mergulhou de cabeça no ofício e na própria espiritualidade cristã para assim chegar em um resultado marcado por instrumentação orquestral, letras ecléticas e sua voz suave. Em entrevista a VEJA, o jovem de 33 anos detalha seu caminho sinuoso até a profissão de cantor, a relação com o pai, seu parecer sobre as críticas ao nepotismo e suas fontes inusitadas de inspiração, como um sonho com John Lennon:

O disco começa com uma colaboração entre você, seu pai e seus irmãos. Por que optou por esse caminho? Essa ideia tem a ver com decisões, mas encaro o processo desse disco e a escolha de cantar com eles como resultado de uma inspiração espiritual, sobrenatural. Não é como se eu pensasse: “Vou fazer assim e assado”. Obviamente, sou atravessado por minhas referências, mas me sinto guiado por forças de outro lugar e apenas as respeito. 

Existe um estigma em torno do nepotismo nas artes. Essa ideia te incomoda? Esse desconforto é real e tem fundamento. É triste que exista essa desigualdade de oportunidades. Tem um lugar onde eu gosto de tomar café e vira e mexe converso com um atendente de lá. Percebi que ele tinha a unha comprida na mão direita e perguntei: “Você toca violão”? Ele respondeu que sim, que tocava violão brasileiro, e trocamos redes sociais. O perfil dizia algo como “quando a inspiração vier, estarei trabalhando” — e aquilo me tocou, me fez pensar em como é importante democratizar as oportunidades na área da música, das artes. Acho que estou mais do lado dos críticos do que na defensiva.

Como é a relação profissional entre vocês? Nossa relação musical é interessante. Eu já tinha tocado só com o meu pai ou só com os meus irmãos, mas nos unimos como quarteto quando surgiu a ideia do [álbum] Ofertório. Meu pai pensou nisso em 2017 e nos convidou. Eu tive certo receio porque não queria trabalhar com música naquela época, mas finalmente cedi e aí começamos a colaborar. Nós somos uma família composta por músicos, mas não nos enxergamos como uma família de músicos que toca como grupo. Cada um é um cantor e compositor por si, mas é interessante interagir dessa forma.

Continua após a publicidade

O que o fez mudar de ideia sobre trabalhar com música? Nunca fui músico profissional, mas, naquela época, acabei fazendo algumas músicas. Uma delas foi Você Me Deu, que cantei com meu pai e foi também gravada por Gal Costa em Estratosférica (2015). Compus ela no piano de casa, quando ainda morava com ele. Ele ouviu, acrescentou a letra e mandou para ela sem nem me contar. Depois disso, continuei pensando em melodias e harmonias, passei pelo soul, inventei letras mais diretas e simples, discotequei e pensei em gravar minhas coisas, mas estava vivendo um momento muito introspectivo. Fui trabalhar com outras coisas. Cursei administração por um período e meio. De lá para cá, me aprofundei bastante no ofício. Minhas referências e minhas composições se desenvolveram.

Sendo assim, qual a linha do tempo por trás do disco? A primeira música que eu fiz foi Talvez Menor, a terceira do disco. Compus ela no piano e fui fazendo a letra ao longo da turnê do Ofertório. A primeira parte surgiu enquanto estávamos na Colômbia. Mostrei aquela metade para o meu irmão Tom em um dia de folga e ele ficou emocionado, chorou, o que foi um sinal muito bom. Fui bastante encorajado por ele a continuar e terminar a faixa. No fim, o que ficou mesmo foi a demo que gravei em casa com voz e violão entre 2019 e 2020. Fui escrevendo mais e terminei as duas últimas em 2021. A gravação em si começou no início de 2022.

Seu trabalho é feito a muitas mãos. Sente que há um movimento musical ao seu redor? Eu não sinto, mas eu sei que ele existe na prática. 

Continua após a publicidade

A melodia de Carolina veio de um sonho seu com John Lennon. Como foi isso? Foi curioso, inesperado e impressionante para mim também. Eu tive esse sonho com o John Lennon no qual ele cantava a melodia da primeira parte da música. Assim que ele terminou, eu acordei. Lembro que ele tinha sim a voz do Lennon e que cantava em inglês, mas só ficou comigo um nome de mulher: Carolina. Peguei meu violão em busca daquela música, botei uns acordes, harmonizei a melodia e fiz uma segunda parte. Depois, pensei em escrever uma letra em inglês e em português, que é um diálogo.

Por que escrever em outra língua? Eu já pensava em puxar a sardinha para o Brasil quando compus Todo Homem, mas tinha também inspirações em Prince e em uma música que eu achava ser do Marvin Gaye, que nunca mais encontrei. Todo Homem tem alguns acordes que vêm do Jazz. O pessoal do Coldplay acabou ouvindo a música e curtiu, nos convidou para cantar com eles, até. Com isso, eu ficava pensando se o sucesso da música vinha do fato dela ser americanizada. Observando a relação entre essas coisas, caí mais ainda nas reflexões sobre a interação entre o nacional e o estrangeiro.

O reconhecimento estrangeiro está em alta, seja na comoção em torno do Oscar ou da indicação do seu pai ao Grammy americano. O que pensa sobre esse efeito? Acho que é o que tem que acontecer. 

Continua após a publicidade

Lançar um álbum inteiro introduz uma nova relação sua com o público e o ofício da música. Como estão as expectativas? Boas, para falar a verdade. Estou muito envolvido com o lançamento, trabalhando na parte visual e no clipe que estamos montando. Eu ainda não consigo ficar tão animado no meio do trabalho, mas espero que alguma hora consiga deixar as coisas fluírem.

Acompanhe notícias e dicas culturais nos blogs a seguir:

  • Tela Plana para novidades da TV e do streaming
  • O Som e a Fúria sobre artistas e lançamentos musicais
  • Em Cartaz traz dicas de filmes no cinema e no streaming
  • Livros para notícias sobre literatura e mercado editorial
Publicidade

About admin