A agência de notícias Bloomberg divulgou nesta terça-feira, 25, a transcrição de uma controversa ligação entre o enviado especial dos Estados Unidos, Steve Witkoff, e o assessor de política externa da Rússia, Yuri Ushakov. Em um telefonema datado de 18 de outubro, pouco depois do acordo entre Israel e Hamas entrar em vigor, o americano deu dicas ao funcionário do Kremlin sobre como lidar com a Casa Branca para conseguir fechar um bom acordo para o fim da guerra na Ucrânia, iniciada em fevereiro de 2022.
No telefonema, o enviado americano diz ao russo: “Bem, escute. Vou lhe dizer uma coisa. Acho que, se conseguirmos resolver a questão Rússia-Ucrânia, todos ficarão muito felizes”. Ushakov, então, sugere uma ligação entre Trump e o presidente da Rússia, Vladimir Putin.
Em seguida, Witkoff orienta: “Eu faria a ligação e reiteraria que você parabeniza o presidente por essa conquista (acordo de Gaza), que você a apoiou, que você a apoiou, que você o respeita por ser um homem de paz e que você está muito feliz por ter visto isso acontecer. Então eu diria isso. Acho que, a partir disso, será uma ligação muito boa”. O republicano é conhecido por baixar a guarda quando elogiado.
“Porque — deixe-me dizer o que eu disse ao Presidente. Eu disse ao presidente que a Federação Russa sempre quis um acordo de paz. Essa é a minha crença. Eu disse ao presidente que acredito nisso. E acredito que a questão é — o problema é que temos duas nações que estão tendo dificuldades para chegar a um consenso e, quando chegarmos, teremos um acordo de paz. Estou até pensando que talvez possamos elaborar uma proposta de paz de 20 pontos, assim como fizemos em Gaza. Elaboramos um plano de paz de 20 pontos, o Plano Trump, que era composto por 20 pontos para a paz, e estou pensando que talvez possamos fazer o mesmo com vocês. Meu ponto é este…”, acrescenta ele.
O assessor russo concorda com a ideia e adianta que Putin “vai parabenizar, vai dizer que o Sr. Trump é um verdadeiro homem da paz e blá-blá-blá”. Mais tarde, Witkoff reforça o pedido: “Eu só quero que você diga, talvez apenas para dizer isso ao Presidente Putin, porque você sabe que tenho o mais profundo respeito pelo Presidente Putin”, diz.
“Talvez ele diga ao Presidente Trump: “Sabe, Steve e Yuri discutiram um plano de paz muito semelhante, com 20 pontos, e isso poderia ser algo que, na nossa opinião, poderia fazer alguma diferença. Estamos abertos a esse tipo de coisa — a explorar o que será necessário para chegar a um acordo de paz.” Agora, eu sei o que será necessário para chegar a um acordo de paz: Donetsk e talvez uma troca de territórios em algum lugar”, afirma o enviado americano.
“Mas estou dizendo que, em vez de falar assim, vamos conversar com mais esperança, porque acho que vamos chegar a um acordo. E acho que Yuri, o presidente, me dará bastante espaço e liberdade para chegar a um acordo”, continua, sendo interrompido por um “entendo” de Ushakov. “Então, se pudermos criar essa oportunidade, depois disso eu conversei com o Yuri e tivemos uma conversa, acho que isso pode levar a grandes coisas.”
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Plano pró-Rússia
Em diferentes ocasiões, Witkoff irritou aliados europeus de Kiev ao atuar em favor do Kremlin após reuniões com altos funcionários russos, até mesmo com Putin. Em paralelo, Dan Driscoll, secretário do Exército dos Estados Unidos, encontrou-se nesta terça com uma delegação russa em Abu Dhabi, capital dos Emirados Árabes Unidos, para apresentar um plano revisado de 19 pontos (antes eram 28), amenizando pontos mais favoráveis a Moscou — reflexo das críticas da Ucrânia e de outrosguerra nna países da Europa.
Numa segunda chamada telefônica, também revelada pela Bloomberg, Ushakov e o oficial russo Kirill Dmitriev conversaram sobre como influenciar os americanos a promover um plano de paz que favorecesse os interesses do Kremlin — entre eles, a redução da força militar de Kiev, a concessão de territórios à Rússia e a desistência ucraniana de aderir à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).
“Bem, precisamos do máximo, não acha?”, perguntou Ushakov, segundo a transcrição. “O que você acha? Caso contrário, qual o sentido de repassar alguma coisa?”
“Não, veja bem”, respondeu Dmitriev. “Acho que vamos elaborar este documento a partir da nossa posição e eu o repassarei informalmente, deixando claro que é tudo informal. E deixarei que eles façam o que quiserem. Mas não creio que eles usarão exatamente a nossa versão, mas pelo menos será o mais próximo possível dela.”