A CBF anunciou a implementação do impedimento semiautomático a partir de 2026 e confirmou a Genius Sports como fornecedora do sistema a ser utilizado no país. A empresa atua na Premier League e traz a experiência de dentro de campo para aprimorar a sua tecnologia.
O ex-assistente de arbitragem da liga inglesa, Harry Lenard é diretor de arbitragem da Genius Sports, Harry Lenard. Depois de 12 anos de carreira, ele se aposentou dos campos e hoje trabalha na empresa de de tecnologia do esporte. A VEJA ele detalhou o funcionamento do SAOT (sigla de impedimento semiautomático em inglês).
O impedimento semiautomático será utilizado no Campeonato Brasileiro da Série A. A Federação Paulista de Futebol (FPF) também negocia implementar a tecnologia no estadual de São Paulo, ainda sem confirmação oficial.
Como funciona a tecnologia?
“O SAOT (Semi-Automatic Offside Technology) da Genius funciona através de aparelhos iPhone. Ele usa 28 a 32 iPhones que filmam em qualidade 4K a 100 quadros por segundo. Usamos de 28 a 32 deles para gravar imagens de diferentes ângulos em todos os estádios. A filmagem sobe para a nuvem através do nosso sistema de IA, depois para o nosso aplicativo SAOT e recebido no centro de replay no Rio [de Janeiro].”

“Então, a imagem aparece na tela, e essa tela é então conectada ao sistema VAR, através de um cabo. Em seguida, quando há uma decisão ajustada, o operador colocará a tela da Genius com o lance na tela.”
Qual a precisão do sistema?
“Considerando este [SAOT da Genius], por termos um mundo virtual, parte do sistema é automatizada. Assim, o sistema selecionará o defensor, o segundo defensor mais recuado, o atacante e o momento do chute da bola. Ocasionalmente, é necessário apenas confirmar o momento do chute na bola, o toque na bola.
Mas, como somos tão precisos, não precisamos do chip de rastreamento, porque filmamos com uma resolução tão boa que geralmente podemos ver o momento exato em que a bola foi tocada. Porque filmamos de forma tão clara, podemos ver quando a bola muda a direção da rotação.”
Há outros tipos de rastreamento?
“Houve três tipos diferentes de rastreamento ao longo dos anos. O primeiro foi o rastreamento do centro de massa. Se estivéssemos correndo em campo, as câmeras captariam um único ponto central aos nossos corpos, para cálculo de velocidades, distâncias, tempos e dados brutos.
A próxima evolução foi algo chamado rastreamento esquelético. Ele rastreia 29 pontos do corpo. Assim como em jogos de computador e filmes, e as pessoas estavam filmando em uma tela azul, elas teriam pontos nelas. A partir dos 29 pontos ele ainda precisa passar por um motor de computador para construir a imagem.
Nós usamos algo chamado rastreamento de malha (mesh tracking). Imagine como uma ‘tela de alambrado’ (chainlink) virtual e coloca-se em cima da minha cabeça cobrindo todo o restante do meu corpo resultando em milhares de curvas diferentes. Assim, temos milhares de pontos de dados em cada corpo.”
Em quais ligas a empresa atua?
“Na Premier League, a Belgian Pro League e a Liga MX a partir de dezembro/janeiro. A CBF, em breve, e nas finais da Conmebol.”
Todos os estádios podem receber a tecnologia?
“Sim. Para fazer o rastreamento em qualquer jogo, precisamos ver a bola e os jogadores de diferentes ângulos, por isso as 28 a 32 câmeras.
Inicialmente, o que fazemos é inspecionar cada estádio para termos um entendimento de onde instalar as câmeras, porque cada estádio é ligeiramente diferente. Além disso, precisamos de largura de banda em todos os estádios, cerca de 700 megabytes por segundo para rodar o sistema.
Há estádios na Inglaterra que são realmente pequenos. Então instalamos desde Wembley, que tem 90.000 [lugares], até no Estádio do Bournemouth, que tem capacidade de 11.000 pessoas. Então, podemos instalar e obter linhas de visão em qualquer lugar. Não há estádio no mundo que nos tenha derrotado.“
Haverá um representante da empresa no estádio?
“Sim, sempre haverá um membro da equipe de plantão em todos os estádios. As câmeras são geralmente inacessíveis às pessoas, mas pode haver ocasiões em que vibram ou se movem devido ao movimento do estádio ou bandeiras podem ser colocadas na frente delas, todos esses tipos de coisas. Já passamos por isso em todas as ligas em que estivemos, mas apenas removemos a bandeira, e ter alguém no estádio nos dá a flexibilidade para poder fazer isso.”
Quem tem acesso às imagens? Como elas são armazenadas?
“A filmagem sobe para um sistema de nuvem. Apertamos um botão para enviar a imagem para as emissoras no caminhão de transmissão ou para o gerente de qualidade no hub do VAR e então eles enviam isso para as emissoras. As imagens são mantidas internamente para nós, e as ligas e confederações podem consultar e usar para treinamento.”
Como funciona a parceria com as empresas do VAR?
“Não somos um provedor de VAR, no momento, estamos licenciados apenas para impedimento semiautomático. Portanto, nosso sistema é tipo plug and play (conectar e usar em tradução livre). Trabalhamos com a Media Pro nas Finais da Conmebol e no México, e na Inglaterra trabalhamos com a Hawkeye. Nosso sistema pode ser conectado e funcionar em qualquer sistema VAR essencialmente.”
Como ex-assistente de arbitragem, como você enxerga a implementação dessa tecnologia no futebol?

“Não há árbitro ou um árbitro assistente que vá a um jogo querendo cometer um erro. Ninguém faz isso. Todos querem acertar 100% das coisas 100% do tempo. Mas a realidade é que o jogo mudou tanto que agora é mais rápido, mais veloz, mais difícil…E para acertar o impedimento todas as vezes, você vai precisar de um pouco de suporte. O jogo não aceita mais decisões incorretas.
Então, ser capaz de fornecer uma tecnologia que impeça isso e os mantenha no centro da atenção é importante, porque este é um ponto realmente crucial, mesmo com as linhas virtuais de impedimento.
Hoje, quando você está em casa ou nas arquibancadas, você vê essas linhas sendo traçadas os pontos e traços. Você fica sabendo do resultado de uma decisão antes dos jogadores e dos árbitros. Isso está errado. As pessoas que precisam saber disso primeiro devem ser os jogadores e os árbitros. E nosso sistema faz exatamente isso. Nós conseguimos informar os árbitros, e então os jogadores primeiro, e só depois a imagem é enviada às emissoras e exibida nos estádios.
De certa forma, restauramos o fluxo natural de compartilhamento de informações dentro do jogo e aceleramos o processo. Eu acredito que essa é a maneira justa de se fazer isso.
Os ingleses inventaram o futebol, mas os brasileiros o tornaram 10 vezes melhor… Agora nós queremos ajudar a retribuir e fazer algo para ajudar o jogo que todos nós amamos, certo? Para ajudar o jogo a ser mais aceito e mais justo com decisões mais rápidas e mais precisas.“