Carnudos, vermelhos, com pintas brancas. Quase sempre são assim os cogumelos na cultura pop. Eles fazem Alice crescer ou encolher em sua visita ao País das Maravilhas, servem de casa para os Smurfs, dão força e vidas extras a Mario e Luigi no videogame. Em variações coloridas, ocupam muitas obras de Yayoi Kusama. A artista japonesa explora suas formas em telas e instalações que parecem sair diretamente do território da fantasia.
O universo dos fungos é, de fato, mágico. Se na ficção e na arte eles são símbolos de transformação, na natureza são capazes de façanhas que parecem mentira. Sob o solo, fungos e raízes de árvores trocam água, minerais, nutrientes e até mesmo alertas. Essa rede silenciosa sustenta cerca de 90% das plantas da Terra.
Apesar de complexo, esse mundo misterioso só ganhou existência própria em 1969, quando o “Reino Fungi” foi oficializado pela biologia como distinto do reino vegetal. Mesmo antes disso, porém, cogumelos já causavam fascínio e temor.
Isso porque suas muitas formas são capazes de confundir. Se mal escolhidos, podem causar danos – seja a personagens ou a pessoas reais. A espécie sedutora do primeiro parágrafo, por exemplo, causa intoxicações e alucinações se ingerida.
Apesar do interesse, por milênios, eles foram exclusivamente coletados. Há vestígios arqueológicos de que seu consumo começou há cerca de 12 mil anos, antes mesmo da agricultura. Mas o cultivo em fazendas só surgiu no fim do século 17, com os champignons de Paris, e ainda levou cem anos para se tornar estável.
Isso se deve ao fato de que o mecanismo natural de reprodução dos fungos é complexo e, portanto, difícil de imitar. E são justamente os cogumelos, a parte visível desse reino de sombras, os responsáveis por isso. Como as únicas partes dos fungos que ficam à mostra, eles liberam os esporos no ar.
Essa dificuldade aumentava o apreço por eles. Os romanos os chamavam de comida dos deuses, e os egípcios, de alimento dos faraós. Povos orientais perceberam cedo suas propriedades medicinais. Na mística Idade Média, associados à escuridão, porém, não eram muito bem aceitos.
Conforme fomos conhecendo e entendendo melhor suas qualidades, tanto as boas quanto as perigosas, nossas “relações diplomáticas” com esses emissários do subterrâneo melhoraram. Em alguns lugares, os cogumelos eram chamados de “carne dos pobres”, por serem uma forma acessível de enriquecer uma sopa ou uma fatia de pão.
Apesar do apelido, não são tão ricos em proteína. Mas oferecem grandes vantagens nutricionais. Têm poucas calorias e gorduras, são ricos em vitaminas e minerais, e carregam ergosterol, que se converte em vitamina D, reforço natural para imunidade e humor.
Sua variedade também alimenta a imaginação culinária. Os “funghi porcini” rendem belos risotos. O shitake dá profundidade a um caldo. Bem temperado, o portobelo substitui um hambúrguer. E o humilde champignon rende patês, sopas, refogados e até kaftas vegetarianas. Fiz e faço com eles lasanhas, entradas leves e sopas, sempre com muito sabor e pouca culpa.
Cogumelos crescem à sombra, mas, quando descobertos, mudam tudo ao redor, na cozinha como nos contos de fada. São a natureza nos lembrando de que nem sempre os bens mais valiosos estão à vista. É preciso olhar com atenção, às vezes até cavar. Os melhores tesouros da vida, como eles, nascem em silêncio.