A Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, dominada pelos republicanos, vota nesta terça-feira, 18, um projeto de lei para a liberação de todos arquivos relacionados a Jeffrey Epstein, bilionário acusado de tráfico sexual de adolescentes que cometeu suicídio na prisão em 2019. Na semana passada, a Comissão de Supervisão da Câmara publicou 20 mil documentos sobre o caso, incluindo e-mails que citavam o presidente dos EUA, Donald Trump, pressionado pela oposição e por membros da sua base política a divulgar os registros.
Às vésperas da votação, Trump deu um giro de 180° e instruiu os deputados republicanos no Congresso a votarem a favor da lei. Foi uma reviravolta repentina para quem passou meses evitando o assunto como quem espera que apenas desapareça, em meio a evidências cada vez mais expressivas da amizade entre Trump e Epstein.
“Os republicanos da Câmara devem votar pela divulgação dos arquivos de Epstein porque não temos nada a esconder. E é tempo de ultrapassarmos esta farsa democrata perpetrada por lunáticos da esquerda radical para desviar a atenção do grande sucesso do Partido Republicano”, escreveu Trump na Truth Social, rede social da qual é dono.
“O Comitê de Supervisão da Câmara pode ter tudo o que lhe é legalmente permitido, NÃO ME IMPORTA! Tudo o que me importa é que os republicanos VOLTEM A CONCENTRAR-SE NO FOCO, que é a economia, a ‘acessibilidade’”, acrescentou no post.
Na segunda-feira, 17, o líder americano voltou a tocar no assunto durante pronunciamento no Salão Oval. Ele disse que não queria que o escândalo sexual de Epstein “desviasse a atenção” das conquistas do seu governo e afirmou, como de praxe, que os e-mails que indicam que Trump sabia dos abusos é uma “farsa” — na semana passada, o mandatário da Casa Branca tentou desviar das críticas sobre a sua relação com o financista ao bradar que “Epstein era democrata, e ele é um problema dos democratas, não dos republicanos!”.
“Vamos dar tudo a eles”, continuou ele aos repórteres. “Deixem o Senado analisar, deixem qualquer um analisar, mas não falem muito sobre isso, porque, sinceramente, não quero que nos tirem isso.”
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E-mails comprometedores
Trocas de e-mails tornadas públicas sugerem que Trump não só sabia dos crimes cometidos por Epstein como passou “horas” com uma das vítimas — na edição publicada pelos democratas, o nome dela não aparece, mas outra versão do lote mostra que seria Virginia Giuffre, uma das principais acusadoras do financista, que morreu por suicídio em abril deste ano. Poucas horas após a movimentação, republicanos da Câmara dos EUA publicaram um grande volume de documentos em uma tentativa de refutar o envolvimento de Trump nos crimes.
As correspondências eletrônicas foram enviadas para Ghislaine Maxwell, cúmplice que foi condenada à prisão por tráfico sexual após a morte do financista; para a advogada Kathryn Ruemmler, ex-conselheira da Casa Branca no governo de Barack Obama; e para o escritor Michael Wolff. Na troca de mensagens, Epstein abordou a amizade com Trump — na época, em campanha presidencial.
Em 2015, Wolff avisou o financista que a emissora americana CNN planejava perguntar sobre a relação do republicano com o bilionário, “seja ao vivo ou em uma conferência de imprensa posterior”. Em resposta, Epstein escreveu: “Se pudéssemos elaborar uma resposta para ele, qual você acha que deveria ser?”.
O escritor, então, deu conselhos ao amigo: “Acho que você deveria deixá-lo se enforcar. Se ele disser que não esteve no avião ou na casa, isso lhe dará uma valiosa imagem pública e moeda política. Você pode enforcá-lo de uma forma que potencialmente lhe traga um benefício positivo ou, se realmente parecer que ele pode vencer, você pode salvá-lo, gerando uma dívida”, disse.
Um e-mail enviado a Ruemmler, em 23 de agosto de 2018, também aumentou o furor de críticas ao presidente dos EUA. “Eu sei o quão sujo Donald é”, escreveu o bilionário, em referência a possíveis escândalos envolvendo Trump.
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Trump e Epstein
A relação entre os dois é antiga: eles faziam parte de círculos sociais de elite de Nova York e da Flórida. Em 2002, Trump disse à revista New York que o financista era “fantástico” e “muito divertido de se estar por perto”. Ele também contou que a dupla se conhecia há 15 anos, acrescentando: “Dizem até que ele gosta de mulheres bonitas tanto quanto eu, e muitas delas são do tipo mais jovem”.
Epstein conviveu com milionários de Wall Street, membros da realeza (notadamente, o príncipe Andrew) e celebridades antes de se declarar culpado de exploração sexual de menores em 2008. As acusações que o levaram à prisão em 2019 ocorreram mais de uma década após um acordo judicial que o protegia. Ele foi encontrado morto por enforcamento pouco mais de um mês após parar atrás das grades.
Como promessa de campanha, Trump disse que liberaria os documentos relacionados ao caso se retornasse à Casa Branca. Em janeiro, quando o republicano publicou arquivos sobre a investigação, um clima de insatisfação tomou conta: as informações divulgadas já eram conhecidas. Pressionado, o presidente dos EUA virou alvo de uma teoria da conspiração dentro da sua base política, a Make America Great Again (MAGA), de que está em uma lista secreta de pessoas que se beneficiavam do esquema de Epstein.
Em setembro, os democratas da Câmara divulgaram uma suposta carta de Trump a Epstein. O documento já havia sido publicado pelo jornal americano The Wall Street Journal em julho, mas o republicano negou a veracidade. Tratava-se de um desenho de uma mulher nua com mensagens insinuantes, parte de um álbum de aniversário organizado para o financista em 2003.