O mercado de ações vive um momento memorável no Brasil. Após anos de desempenho pífio, perdendo a corrida para a renda fixa anabolizada por taxas de juros estratosféricas, a bolsa tem batido sucessivos recordes nominais. Do fim de outubro até a última terça-feira, 11, o Ibovespa enfileirou quinze pregões ininterruptos de alta — algo que não era visto desde 1994 — e superou os 157 000 pontos pela primeira vez na história. Com isso, acumula uma valorização de cerca de 30% no ano, impulsionada por fatores que vão do regresso dos investidores estrangeiros à expectativa de queda da taxa básica de juros, a Selic, em 2026. A pergunta agora é se esse ciclo seguirá por mais tempo. O fim do ano não conta muito para dar uma resposta precisa a essa questão. Desde a virada do século, o Ibovespa registrou alta no mês de dezembro em apenas doze anos. Em 2024, por exemplo, a queda mensal foi de 4%, jogando a última pá de cal em um ano que encerrou com um tombo acumulado de 10%.
O que terá mais peso no futuro próximo da bolsa é o comportamento dos estrangeiros, que se tornaram os principais responsáveis pela disparada recente. Entre compras e vendas, esse grupo já acumula um saldo líquido de 25 bilhões de reais na bolsa no ano. Não é que o Brasil tenha se tornado subitamente o Jardim do Éden dos financistas, mas as opções lá fora estão piores. As tensões geopolíticas, as dúvidas sobre o crescimento da China e o tarifaço imposto por Donald Trump às importações de seus parceiros comerciais tumultuam o cenário global. Além disso, os Estados Unidos ainda exibem juros altos para seus padrões, mesmo após o Federal Reserve promover dois cortes que somam 0,5 ponto percentual desde setembro, trazendo a taxa para a faixa de 3,75% a 4% ao ano. Por isso, os grandes fundos que precisam alocar parte do capital em ativos de risco rodam o mundo à caça de oportunidades e encontram no mercado brasileiro boas pechinchas. Em reais, o principal índice da bolsa subiu como um foguete. Convertidos para dólares, porém, seus atuais 28 000 pontos estão muito aquém do pico histórico de 40 000 pontos batido em 2008. “Os estrangeiros buscam países com boas condições e o Brasil se destaca comparativamente”, diz Evandro Buccini, diretor da Rio Bravo Investimentos.
O otimismo também é sustentado pela aposta de que o Banco Central baixará os juros no ano que vem. Embora Gabriel Galípolo, seu presidente, afirme que manterá a Selic nos atuais 15% até que a inflação convirja para o centro da meta de 3%, os analistas estimam que a taxa encerrará 2026 em 12,25%. Por isso, as ações mais sensíveis aos juros já esboçam alguma reação. “Papéis de consumo, varejo e construção civil lideram a recuperação”, diz Nicholas McCarthy, diretor de estratégia de investimentos do Itaú. Com isso, o Ibovespa pode alcançar 160 000 pontos até o fim do ano. Quando, enfim, a Selic começar a cair, o fôlego para uma nova arrancada será renovado. “Nos últimos ciclos de cortes, a bolsa subiu, em média, 57% nos vinte e quatro meses seguintes ao início da queda dos juros”, afirma Rodrigo Santoro, chefe de renda variável da Bradesco Asset Management. Segundo Santoro, isso permitiria ao Ibovespa alcançar os 185 000 pontos em 2026, assinalando nova sequência de recordes no índice.

Outra variável decisiva para consolidar — ou não — a tendência de alta é a eleição presidencial no ano que vem, que já influencia o humor dos investidores. O mercado observa com preocupação o populismo fiscal do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu afã de se reeleger. Para o diretor de gestão da Hike Capital, Ângelo Belitardo, o cenário requer cautela. “Não estamos otimistas”, diz. “O déficit primário já ultrapassou 100 bilhões de reais e o governo enfrenta dificuldades para se financiar via títulos indexados à inflação.” De acordo com Belitardo, isso impede uma queda convincente da Selic. Na ata da última reunião, divulgada na terça-feira, 11, o Comitê de Política Monetária do Banco Central foi pela mesma linha ao frisar que apenas uma política fiscal responsável reduzirá o prêmio de risco exigido pelos investidores para financiar a dívida pública, abrindo caminho para o corte dos juros. Como sempre, projetos políticos pessoais podem estragar uma boa notícia.
Publicado em VEJA de 14 de novembro de 2025, edição nº 2970