Desde a sua estreia, no dia 20 de outubro, Três Graças tem se destacado por abrir espaço para debates sobre questões sociais – algo que o remake de Vale Tudo deixou a desejar. Além de focar nas dificuldades das “mães solo”, a novela de Aguinaldo Silva colocou o aborto no enredo. O capítulo exibido na quarta-feira, 28, chamou atenção pelo viés religioso da discussão, sinalizando uma possível estratégia da Globo de se aproximar do público evangélico.
O diálogo surgiu em uma cena de cerca de dois minutos, quando Joélly Maria (Alana Cabral) conta a Kellen (Luiza Rosa) sobre o pedido de Raul (Paulo Mendes) para que ela não tenha o bebê. A amiga, que é filha do pastor evangélico Albérico (Enrique Diaz), logo a interrompe ao perceber que a filha de Gerluce (Sophie Charlotte) cogitou fazer um aborto. “Se você está pensando… Não quero nem falar essa palavra. Deus dá a vida que somente ele pode tomar de volta”, disse ela, acrescentando trechos da bíblia. “Há um tempo certo para cada propósito debaixo do céu. O que aconteceu foi que vocês pularam etapas. Isso pode parecer um erro, mas Deus transforma nossos erros em acertos possíveis. Essa criança vai ser uma benção na vida de vocês. Só que para vocês viverem isso, os dois têm que assumir”, completou.
Não é de hoje que a Globo tenta conquistar o público religioso. Em 2023, por exemplo, a novela Vai na Fé, de Rosane Svartman, cuja protagonista era uma mulher evangélica. Além disso, o reality show Estrela da Casa tinha participantes do universo gospel. Essa movimentação reflete uma tentativa da emissora de reconquistar a audiência, especialmente em folhetins da casa, diante das mudanças do perfil religioso no Brasil.
De acordo com o Censo Demográfico, entre 2010 e 2022 houve redução do número de católicos apostólicos romanos (de 64,6% para 56,7%) e um aumento de evangélicos (de 22,2% para 26,9%) e sem religião (de 7,9% para 9,3%). A proporção de evangélicos e sem religião no país cresceu, respectivamente, 5,2 e 1,4 pontos percentuais.
O tema do aborto também entra nessa realidade. Segundo pesquisa do Datafolha de 2023, apenas 6% dos brasileiros são favoráveis à descriminalização do procedimento. Entre os evangélicos, 44% defendem a proibição total, índice que cai para 34% entre católicos e 32% entre espíritas.