Veneza impôs uma taxa aos chamados “visitantes de um dia”, em abril do ano passado, em uma tentativa de pôr um freio no turismo de massa. Portugal vive um período áureo, com Lisboa registrando um crescimento contínuo de turistas. Paris, que recebeu cerca de 48 milhões de pessoas em 2024 – 21 vezes a sua população –, continua recepcionando cada vez mais gente. Cidades de Istambul, na Turquia, e Bangkok, na Tailândia, também se mantêm entre as recordistas em atração de visitantes. Junto com melhorias de infraestrutura, promoção de grandes eventos e aumento da malha aérea, um motivo tem sido determinante também para esse boom nos destinos mais almejados do planeta.

Cunhado em meio à pandemia, o termo revenge travel (viagem de vingança) quer dizer, em linhas gerais, que as pessoas passaram a desejar mais conhecer novos destinos e viver mais experiências para compensar o tempo perdido e as férias canceladas durante o período de confinamento por causa da Covid-19. Os números do setor, porém, mostram que a expressão, que surgiu inicialmente nas redes sociais e ganhou força a partir de 2021, não se aplica só ao período logo após as fronteiras se abrirem. A viagem de vingança continua em pleno vigor, impulsionada pela consciência da brevidade da vida e pela vontade de aproveitar cada momento.

Para muita gente, é inquestionável, que aquele período de reclusão compulsória despertou em muitos o desejo por mais liberdade e fez com que muita gente revisse suas prioridades. Os números da Organização Mundial do Turismo (OMT) reiteram essa transformação. No ano passado, mais de 1,4 bilhão de turistas no mundo fizeram viagens para o exterior, superando os níveis pré-pandemia e atingindo um marco histórico para o turismo global.
Pesquisas mostram ainda que nos três primeiros meses de 2025, o movimento de viajantes internacionais aumentou 5% em relação ao mesmo período do ano passando e 3% se comparado com o primeiro trimestre de 2019, um ano antes da pandemia. “A viagem de vingança não só continua, como ela se desdobrou em outros nomes. Virou vingança por um chefe ruim, por um burnout, por uma determinada tarefa concluída. Cada vez mais as pessoas se premiam com uma viagem por motivos variados”, ressalta Mariana Aldrigui, professora e pesquisadora da área de turismo da USP.

Aldrigui observa ainda que esse fenômeno resultou no incremento do segmento como um todo, como o aumento das buscas por viagens de lazer, das corporativas, com algum compromisso de sustentabilidade, mas, em especial nos últimos tempos, do turismo de bem-estar. E não é só isso. “As gerações mais novas, sobretudo, podem não ter recursos para comprar um carro, para investir num bem maior, mas não abrem mão de realizar seus desejos relacionados a viagens”, completa.

Não restam dúvidas de que as viagens de vingança geraram saldos positivos para o mercado. Pesquisadores apontam que o termo revenge travel deriva de uma expressão surgida na China nos Anos 1980, a revenge spending, quando eclodiu naquele país uma corrida por compras após longos períodos de privação de consumo. Com o passar dos anos, o boom consumista arrefeceu, apesar dos esforços daquele país para estimular os gastos. Agora, se a “vingança” na área das viagens permanecerá na mesma cadência acelerada, só o tempo dirá.
