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Anvisa proíbe implantes hormonais de uma das maiores empresas do ramo no país

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) anunciou nesta quarta-feira, 23, uma medida preventiva contra a Elmeco, uma das principais produtoras de implantes hormonais do país. Segundo a resolução, a manipulação de todos os produtos estéreis da empresa — ou seja, aqueles que precisam estar completamente livres de bactérias, fungos e outros microrganismos para não causar infecções — foi suspensa, devido a falhas graves nas Boas Práticas de Manipulação.

Além disso, dois produtos receberam uma medida ainda mais rígida, estando não apenas suspensos, mas definitivamente proibidos: os implantes de testosterona e de Nesterone, um esteroide que a Elmeco aplicava via implante para uma série de finalidades, incluindo contracepção, tratamento de miomas uterinos, síndrome do ovário policístico, endometriose e até em pessoas com histórico de AVC.

No caso do Nesterone, a Anvisa ressalta que o fármaco nunca teve sua eficácia e segurança avaliadas oficialmente. Já os implantes de testosterona apresentavam falhas críticas no processo de limpeza e despirogenização dos frascos, o que aumenta o risco de exposição a endotoxinas bacterianas, substâncias capazes de provocar reações graves no organismo.

A decisão da Anvisa está baseada na Resolução-Re nº 4.171/2025, que detalha a suspensão da manipulação de todas as preparações estéreis da Elmeco e a proibição específica do Nesterone e dos implantes de testosterona. Segundo o documento, a medida visa proteger os pacientes, evitando riscos de contaminação, adulteração de produtos e exposição a substâncias perigosas.

A história da Elmeco e os implantes hormonais

Fundada em 1993 pelo ginecologista Elsimar Coutinho — falecido em 2020 —, a Elmeco se tornou a primeira farmácia do país dedicada à produção de implantes hormonais, mesmo sem uma regulamentação específica da Anvisa para esse tipo de dispositivo.

Figura polêmica, Coutinho ficou conhecido por defender o uso terapêutico da gestrinona, um esteroide anabolizante derivado da nandrolona, que por sua vez vem da testosterona. Nos anos 1970, a substância chegou a ser usada por via oral no tratamento da endometriose, mas foi abandonada décadas depois por causar efeitos colaterais como acne, oleosidade e queda de cabelo, além da chegada de alternativas mais seguras. Mesmo assim, o médico apostou em uma nova via: a dos implantes subcutâneos, que seguem até hoje como carro-chefe da empresa criada por ele.

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Com o tempo, a Elmeco incorporou outras substâncias ao portfólio, como testosterona, oxandrolona e nesterone, defendendo que esses hormônios — todos incluídos na lista de substâncias proibidas por agências antidoping — poderiam ter diferentes usos terapêuticos, de casos de sarcopenia e miomas uterinos à reposição hormonal. Em sua própria comunicação, porém, a empresa reconhece que esses tratamentos também trazem ganhos “secundários”. No caso do implante de testosterona, por exemplo, o site da empresa destaca benefícios como aumento da libido, disposição e massa muscular.

O boom dos implantes aconteceu em 2023, quando o apelo estético superou as supostas alegações terapêuticas, rendendo aos dispositivos o apelido de “chip da beleza”. Influenciadores digitais ajudaram a transformá-los em fenômeno de mercado, prescrito por vários médicos e manipulado por diferentes farmácias do país. Essa tendência, no entanto, veio acompanhada de críticas: especialistas alertaram para o uso indiscriminado dos hormônios, a falta de evidências científicas robustas e desvios éticos em nome de interesses comerciais — trata-se, afinal, de um mercado lucrativo.

Com a popularização, também se multiplicaram os relatos de efeitos adversos, que vão de acne e queda de cabelo a quadros mais graves, como distúrbios hepáticos e cardiovasculares. Diante desse cenário, entidades médicas como SBEM, Febrasgo e Abeso passaram a se posicionar contra o uso dos dispositivos, argumentando que, mesmo quando indicados para fins terapêuticos, ainda faltam estudos consistentes que comprovem sua segurança e eficácia. O debate culminou, em outubro de 2024, na decisão da Anvisa de proibir a comercialização dos implantes. Pouco tempo depois, a agência recuou, liberando o uso sob regras mais rígidas de manipulação e prescrição.

A Elmeco foi uma das principais vozes na defesa dos dispositivos. Representantes da empresa marcaram presença em audiências no Senado Federal e participaram da criação de uma associação voltada à defesa dos implantes hormonais — embora sem vínculo com a Associação Médica Brasileira (AMB).

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Entidades médicas reagem à decisão

Em nota conjunta, SBEM, Febrasgo, Abeso e a Sociedade Brasileira de Urologia reforçam que a medida da Anvisa é positiva, mas que ainda precisa ser mais abrangente. Segundo as entidades, a proibição parcial da Elmeco não resolve o problema do uso indiscriminado de hormônios em vias, doses e indicações não respaldadas pela ciência. Elas afirmam que existem diversas outras farmácias de manipulação produzindo e médicos prescrevendo implantes, além de outras substâncias circulando no mercado.

“A Febrasgo entende a medida tomada pela Anvisa como uma proteção à saúde da população brasileira e espera que novas ações de controle do uso de hormônios manipulados, especialmente na forma de implantes, venham a ser adotadas, em sintonia com o alerta que várias sociedades médicas vêm fazendo há anos”, afirmou em nota.

As sociedades declararam, ainda, que os riscos dessa prática superam qualquer benefício em potencial e que existem formas éticas e aprovadas de tratamento, seja para reposição hormonal, sarcopenia ou mesmo endometriose.

A reportagem questionou a Anvisa sobre os critérios utilizados para aplicar a proibição apenas à Elmeco, sobre a escolha de incluir especificamente o Nesterone e os implantes de testosterona — e não a gestrinona, apesar de também ser amplamente manipulada via implante — e ainda sobre a previsão de fiscalização ou regulamentação para outras empresas que comercializam ou aplicam implantes hormonais similares. Até o momento, a agência não havia respondido aos questionamentos.

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O que diz a Elmeco?

Em resposta à decisão da Anvisa, a Elmeco informou que, após a última inspeção realizada neste mês, já cumpriu as adequações necessárias. A empresa protocolou, na última quarta-feira, 15, junto à fiscalização sanitária regional, um plano de ação que demonstra sua conformidade operacional.

No entanto, a Elmeco registrou que discorda do conteúdo da resolução publicada pela Anvisa e informou que adotará todas as medidas cabíveis para esclarecer a situação, “a ponto de confirmar, de forma induvidosa, a legitimidade de sua atuação empresarial”.

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