A “química” entre Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump pode render dividendos políticos ao presidente brasileiro. A avaliação é do cientista político e sociólogo Antônio Lavareda, que vê na reaproximação entre os dois líderes uma oportunidade para o governo petista reforçar sua imagem internacional e melhorar sua popularidade interna.
Em entrevista ao programa Ponto de Vista, do site de VEJA, apresentado por Marcela Rahal, Lavareda analisou os efeitos políticos do gesto de cordialidade de Trump, que pode se encontrar pessoalmente com Lula em breve.
“O fator Trump irrompeu na política brasileira e deve ter papel importante em 2026. Ele é um personagem imprevisível, mas que já contribuiu para a performance de imagem do presidente Lula”, afirmou o cientista político.
Da tensão ao “clima petroquímico”
A mudança de tom começou com o próprio Lula, que, em tom descontraído, disse ter sentido “uma indústria petroquímica” de afinidade com o americano, após um breve encontro durante a Assembleia-Geral da ONU. A anedota foi rapidamente explorada pelo Planalto como um símbolo de reaproximação diplomática — e, segundo Lavareda, pode ter efeito direto na percepção pública.
“O Brasil reagiu com indignação ao tarifaço imposto pelos Estados Unidos. Isso gerou um fenômeno conhecido na ciência política como rally around the flag — a sociedade se une em torno do seu líder quando o país é atacado externamente”, explicou.
Pesquisas do IPESP mostram que 61% dos brasileiros desaprovam a postura de Trump em relação ao Brasil após o episódio das tarifas. Esse cenário, segundo Lavareda, favoreceu Lula:
“A população reagiu com solidariedade ao presidente. Foi o primeiro momento em que a crise comercial acabou revertida em capital político para o governo.”
A química como ativo político
Para o cientista político, a posterior mudança de postura de Trump — agora mais cordial — reforça ainda mais o efeito positivo para Lula.
“Até opositores ideológicos de Lula são admiradores de Trump. Quando o ídolo deles passa a elogiar o presidente brasileiro, isso ajuda a desconstruir parte das críticas internas”, analisou.
Lavareda lembrou que o tom de elogio de Trump ecoa o episódio de 2009, quando Barack Obama chamou Lula de “o cara”.
“Trump quase repete Obama. Ele manifesta admiração e destaca uma relação de respeito com o brasileiro. Isso tem peso simbólico para o eleitorado”, afirmou.
Idade como trunfo e não obstáculo
Um terceiro ponto citado por Lavareda é a “legitimidade etária” que Trump confere a Lula.
“Trump, presidente da maior nação do mundo, tem exatamente a mesma idade que Lula. E ninguém questiona a idade dele como obstáculo. Isso ajuda o presidente brasileiro a neutralizar um tema que certamente será explorado na campanha de 2026”, observou.
Um personagem americano na política brasileira
Para Lavareda, a presença de Trump no debate político nacional é um fenômeno novo — e com efeitos ainda imprevisíveis.
“Trump se tornou um personagem da política interna brasileira. A questão é saber qual será o sinal de sua atuação — se positivo ou negativo —, mas o simples fato de ele reconhecer Lula como interlocutor já é, por si só, um ganho para o Planalto”, concluiu.