A energia faz parte de todas as atividades humanas, seja na rotina pessoal ou no ambiente produtivo. Em qualquer momento do dia, a qualidade de vida e a força da economia dependem diretamente do acesso a fontes estáveis e acessíveis. E elas foram conquistadas ao longo de uma jornada milenar, que influenciou diretamente a trajetória da nossa espécie.
“O domínio da agricultura, há aproximadamente 10 000 anos, representou uma transição energética, já que passamos a ter controle sobre a comida, nossa principal fonte de energia. Assim, pudemos organizar o tempo de outra maneira e construir as civilizações”, exemplifica Roberto Schaeffer, professor do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Desde então, foram muitas transições energéticas ao longo da história, segundo ele, que é Ph.D. em política energética pela Universidade da Pensilvânia. Todas incentivadas pelo desenvolvimento de tecnologias mais baratas e eficientes, como aconteceu quando os navios a vela migraram para o motor a vapor e, depois, para os combustíveis fósseis líquidos.
O que se passa no século 21 é diferente e inédito: “Agora não estamos buscando fontes que sejam obrigatoriamente mais baratas e mais eficientes. As opções renováveis tendem a ser mais caras, num primeiro momento. O foco agora é na redução das emissões, uma demanda importantíssima para a sobrevivência da sociedade”, diz o professor. Mas ele alerta: “Se essa jornada não for bem conduzida, o acesso à eletricidade e à mobilidade vai se tornar mais caro, o que impacta especialmente a parcela mais pobre da população”.
Nesse contexto, o setor de óleo e gás, que participou de maneira decisiva da transição energética que impulsionou a humanidade nos últimos 160 anos, pode seguir contribuindo para que a próxima etapa seja conduzida com segurança para a economia — e para todos os setores da sociedade.
“O petróleo e o gás oferecem 55% da energia primária do mundo, e o óleo brasileiro tem uma intensidade de carbono na sua produção menor que a média global. São insumos eficientes e acessíveis. A transição para as fontes renováveis já está acontecendo, com o apoio do setor, que segue trabalhando para garantir o acesso, sem perder de vista a importância de reduzir a pobreza energética”, diz Roberto Ardenghy, presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP).
Recentemente, a entidade lançou a campanha setorial Energia da Evolução, que tem como objetivo explicar como o petróleo e o gás estão presentes no dia a dia e são essenciais para o futuro do país. O petróleo, por exemplo, é um insumo vital na indústria petroquímica, que transforma a matéria-prima em plásticos, fertilizantes, solventes e inúmeros outros produtos fundamentais para diversos setores, incluindo agricultura, saúde e manufatura. Já o gás natural é uma fonte importante de matéria-prima para a produção de hidrogênio e amônia, utilizados na fabricação de fertilizantes e na indústria química.
Impacto social
A pobreza energética é uma questão crucial para as próximas décadas, especialmente quando se leva em conta que a população global vem diminuindo rapidamente nos países desenvolvidos, mas vai seguir crescendo nas nações mais pobres, especialmente na África. A desigualdade social, que já é enorme, pode ser ainda mais intensificada.
De acordo com relatório produzido por um conjunto de agências internacionais e de entidades da Organização das Nações Unidas, o número de pessoas sem acesso à eletricidade aumentou a uma taxa superior à das novas conexões. O que indica que o planeta segue longe de alcançar o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 7, focado em garantir o acesso à energia limpa e acessível para todos até 2030.
No Brasil, apesar de o acesso à energia elétrica ser quase universal, aproximadamente 1,4 milhão dos domicílios não contam com eletricidade em tempo integral, de acordo com a Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Muitas famílias com tarifa social consomem o suficiente apenas para manter ligada uma geladeira e uma ou duas lâmpadas, um claro sinal de desigualdade.
Diretamente ligada ao preço da energia, a mobilidade também representa um custo importante e de grande impacto, assim como a alimentação, segundo Schaeffer. “Os pobres são os mais impactados pela dificuldade de acesso ao transporte. Muitas pessoas em São Paulo vão ao trabalho a pé, por exemplo, e é para economizar dinheiro. Outras cozinham queimando lenha ou papelão para evitar utilizar gás. Esse aspecto precisa ser considerado no novo cenário de geração de energia.”
Ardenghy lembra que a COP30, a ser realizada em breve em Belém (PA), representa uma oportunidade de trazer essa questão à pauta. “As questões ambientais são, em sua base, econômicas. A transição sustentável e justa passa pelo desenvolvimento econômico, particularmente dos países e das regiões que não se beneficiaram do auge da expansão dos últimos dois séculos”, afirma. “O preço e o acesso continuam sendo estratégicos nesse processo, especialmente quando se lembra que o mundo descarbonizado não é o mesmo para todos.”