Na última quarta-feira, 8, a Câmara dos Deputados enterrou uma medida provisória (MP) que aumentava impostos de alguns setores, como as fintechs, a fim de garantir o cumprimento das metas fiscais de 2025 e 2026.
Com a rejeição da MP, o governo terá de cobrir um rombo de 35 bilhões de reais no Orçamento do próximo ano, seja criando novas fontes de receita, seu receituário predileto, seja cortando gastos, o que Lula não gosta de fazer.
Na véspera da votação, o presidente sabia que dificilmente sairia vitorioso. Para evitar o constrangimento no plenário, ele podia deixar que o texto perdesse a validade, mas preferiu orientar sua base de apoio a cobrar a realização da votação. Essa opção tinha um objetivo eleitoral.
Como a MP rejeitada previa mais tributos para empresas que operam como instituições financeiras, Lula e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, aproveitaram o revés para acusar o Congresso e a oposição de defenderem os interesses dos mais ricos, enquanto a gestão petista trabalharia para beneficiar as camadas mais pobres da população.
Sem a MP, declarou o presidente, investimentos em saúde e educação podem não sair do papel, prejudicando justamente quem mais precisa. Ou seja: empregado no debate sobre a isenção do imposto de renda para quem ganha até 5 000 reais, o discurso da justiça tributária — ou a promessa de cobrar mais de quem ganha mais para cobrar menos de quem ganha menos — voltou com tudo ao centro do debate.
“Foi triste porque uma parte do Congresso Nacional votou contra a taxação que a gente queria fazer dos bilionários deste país, daqueles que ganham muito e pagam pouco. Vocês não podem ficar quietos”, afirmou o presidente na Bahia, ao participar da inauguração da fábrica de uma montadora de automóveis.
Já Haddad recorreu às redes sociais para reforçar o coro. “Para garantir os investimentos em saúde, educação e previdência de 2026, a MP buscava cobrar o mínimo de bilionários, bancos e bets. Uma operação simples e justa, proteger os direitos daqueles que ganham menos e cobrando a justa parte dos que ganham muito mais e não pagam quase nada”, declarou o ministro.
“Não foi descuido. Foi escolha. Escolha consciente de tirar direitos dos mais pobres para proteger os privilégios, blindar os mesmos amigos de sempre e forçar cortes contra aqueles que mais precisam do Estado”, acrescentou Haddad.
Em público, governistas acusaram o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, nome preferido do Centrão e de setores da elite econômica para disputar a Presidência, de articular a derrubada da medida provisória. Tarcísio também publicou um vídeo nas redes sociais para negar qualquer participação no episódio, rebater Haddad e cobrar do governo que corte gastos em vez de aumentar impostos.
O discurso da justiça tributária — traduzido no duelo entre ricos e pobres — é uma releitura do notório “nós contra eles”, que foi usado por Lula para se livrar da crise do mensalão e conquistar a reeleição em 2026.
Naquela época, o petista alegava que a oposição, representando a elite, estava usando a descoberta do esquema suborno parlamentar como pretexto para derrubar o primeiro projeto genuinamente popular a chegar ao poder no Brasil.