Sátántangó. Eis o estranho, instigante e diabólico título do único romance do escritor húngaro e Prêmio Nobel László Krasznahorkai publicado no Brasil. Uma história estranha, com gente esquisita, em clima de apocalipse e montada com frases longas e tortuosas. Daqueles livros que exigem um pacto com o leitor, não isento de sofrimentos pelo percurso, mas de saldo um tanto quanto catártico.
Podemos encará-lo, em bom português, graças ao trabalho de tradução direta do húngaro realizado por Paulo Schiller para a edição da Companhia das Letras. Schiller comenta, a seguir, a força dessa obra e o desafio de mergulhar no texto de Krasznahorkai.

Com a palavra, o tradutor do Nobel.
“Prêmio merecidíssimo. Depois do Man Booker International Prize, em 2015, sempre achei que ele ganharia o Nobel. Sempre pensei em Sátántangó como um Grande Sertão: Veredas húngaro, em que, em vez da seca, chove o tempo todo.
O livro tem parágrafos muito longos, de tradução difícil. Eu cheguei a começar e desisti. Conhecidos meus do meio literário na Hungria me diziam que o livro “acabou” com muitos tradutores.
Depois vi o longo filme de sete horas e meia baseado na obra, filmado por Béla Tarr, e fiquei tão encantado que resolvi retomar. Foi meu trabalho da pandemia.
László diz que pensa suas frases e só as escreve quando já estão mentalmente finalizadas. São frases densas, muitas vezes sem pontuação e que se estendem por páginas. Tudo isso torna a tradução muito trabalhosa.

Lembro que a edição brasileira de Sátántangó ganhou o prêmio de melhor tradução de 2023 pela Biblioteca Nacional.
Perguntaram a ele por que alguém leria um livro que demanda tanto. Ao que László respondeu: porque o livro fala sobre você (e cada um de nós).
Sátántangó é uma magnífica alegoria sobre a armadilha dos regimes populistas.
Nesse aspecto, também foi uma inspiração importante para a escrita do meu livro recém-publicado pela editora Todavia: A Paixão pela Mentira.