counter ‘Escultor do vento’, Carlos Malta homenageia Hermeto Pascoal em concerto – Forsething

‘Escultor do vento’, Carlos Malta homenageia Hermeto Pascoal em concerto

O carioca Carlos Malta tinha apenas 20 anos quando entrou para o grupo no qual permaneceria por mais de uma década, encabeçado pelo lendário “bruxo” da música brasileira instrumental Hermeto Pascoal, morto aos 89 anos em 13 de setembro. Daqueles primeiros passos e ensinamentos, surgiria uma carreira brilhante que, 45 anos depois, o leva ao palco do Teatro Cultura Artística (ingressos a R$ 120), em São Paulo, com acompanhamento da Orquestra Brasil Jazz Sinfônica, que desde 1989 estabelece ponte entre a erudição convencional, expressões populares e o improviso próprio do gênero que a dá nome. Junto aos 70 músicos que a compõem e ao maestro Gustavo Petri, que a conduz, Malta apresentará um repertório diverso que contempla toda sua carreira, entre releituras de colegas e o trabalho próprio. Passa, por exemplo, pelo trabalho autoral apresentado no disco Escultor do Vento (1997), por sucessos de Gilberto Gil e Pixinguinha e pelo som de instrumentos étnicos indígenas e asiáticos. Em entrevista a VEJA, Malta discute as influências de Pascoal, as preparações para o concerto, os instrumentos de sopro inusitados que domina e as origens de seu apelido marcante.

O senhor ingressou no grupo de Hermeto Pascoal aos 20 anos. O quanto essa experiência ainda o permeia? Quando eu ingressei no Hermeto, já tinha mais ou menos cinco anos de carreira. Aos 15, já até ganhava um dinheirinho com o qual paguei as prestações de uma flauta que tenho até hoje. Cheguei lá com uma certa bagagem de música contemporânea e de música sinfônica que me ajudava a interpretar as coisas dele, porque eu frequentava tudo que era concerto na adolescência. Vi Jean-Pierre Rampal ao vivo e conheci o Victor Assis Brasil, por exemplo. Ao longo dos 12 anos em que toquei com ele, aquele som do Hermeto ficou impresso em mim. Ele mostrava que a sinfônica podia fazer tudo, que ela é um navio capaz de zarpar a qualquer lugar com uma sonoridade maleável.

Hermeto Pascoal integra também o repertório do show que apresentará na Cultura Artística. Como é tocar obras dele após a morte do mestre? É uma coisa que promete. Ainda não posso falar sobre o que preparamos, mas o Hermeto sempre reservou surpresas para o conjunto sinfônico. Como eu assisti algumas vezes esse tipo de diálogo entre o solista e a orquestra, vai ter um momento muito especial dedicado ao campeão.

De onde vem o apelido “Escultor do Vento”? Assim que eu saí do grupo do Hermeto, encarei o quadro branco e, pensando no que iria fazer, criei os grupos Coreto Urbano e o Pife Muderno. Fui me juntando a uma turma de músicos — Albertinho Silva, Daniel Pezzotti, Nelson Faria, Nico Assunção, Leandro Braga e Guinga, Nejane Duboc, Lenine e mais. Era hora de procurar os meus e, como passei 12 anos concentrado no subúrbio, não conhecia muita gente. Fui me informando e gravando por aí até chegar no (disco de estreia) Escultor do Vento. Na mesma época, estava preparando um projeto para o Centro Cultural do Banco do Brasil, no qual me apresentaria com um grupo de instrumentistas de sopro. A ideia era muito bonita e me fez pensar em um nome. Viajando nas ideias, pensei que soprar um instrumento é esculpir o vento. A sacada caiu no meu colo.

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O senhor domina também instrumentos étnicos pouco difundidos no Brasil, como o shakuhachi, do Japão, e o dizi, da China. Como chegou a eles? É a curiosidade do instrumentista. Nós que tocamos não conseguimos ouvir um som sem pensar de onde ele vem. Assim se colecionam instrumentos na mente. Eu venho de uma época em que não existia Google, então as coisas eram testemunhadas ao vivo e a cores, no máximo divulgadas na televisão ou no rádio, onde se podia saber que um grupo japonês viria ao Brasil para tocar flauta. Eu adoro os instrumentos industrializados, mas tenho verdadeiro fascínio pela coisa artesanal. Acho lindo quando a gente pega um instrumento feito por um cara que não sabe ler nem escrever, mas que coloca a mão na massa, marca o instrumento todo e bota fogo naquilo ali, e o resultado soa com um violino que custa 400 mil dólares. A conversa musical não é pelo valor do instrumento, é pelo que sai do instrumentista. Cruzamentos assim são muito importantes. O conceito se aplica à flauta Uruá, feita pelo povo Kamayura, e à Kuluta também, que é uma flauta vermelha própria dos Kuikuro, que carregam uma tradição de flauta. Os brasileiros fazem esse som há muitos milhares de anos. Eu trago a sonoridade do Brasil originário para a orquestra sinfônica e, com isso, chego à música universal.

O que espera que os ouvintes carreguem após sair de um concerto seu? Eu espero que as pessoas saiam melhores do que chegaram. Sempre toco na esperança de que a música apresentada traga um misto de paz, de entretenimento, de entusiasmo, de admiração e também de auto-reconhecimento ao enxergar aquela sonoridade tão brasileira. Como a Elis cantava, “o Brazil não conhece o Brasil”.

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A Orquestra Brasil Jazz Sinfônica//Divulgação

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