O governo dos Estados Unidos entrou em paralisação às 00h01 desta quarta-feira, 1º de outubro, depois que os republicanos do presidente Donald Trump não conseguiram chegar a um acordo com o Partido Democrata para aprovar uma lei orçamentária e estender o financiamento de serviços públicos. Isso significa que alguns setores do governo ficarão em estado de suspensão até que a legislação seja aprovada. Esta é a 15ª vez que o país entra em “shutdown” desde 1981.
Paralisações por disputas orçamentárias são um aspecto único da política americana. Lá, os diferentes poderes do governo precisam chegar a um acordo sobre os planos de gastos antes que eles se tornem lei. Na maioria dos países, as votações são uma espécie de voto de confiança no próprio governo. Mas, como os Estados Unidos têm poderes com pesos iguais e, frequentemente, divididos, esse não é o caso.
Impacto
Os serviços considerados não essenciais foram suspensos temporariamente, e cerca de 750 mil funcionários – cerca de 40% do total – foram afastados sem remuneração, segundo estimativa do Escritório de Orçamento do Congresso (CBO). Em paralisações passadas, quando esses trabalhadores foram chamados de volta, receberam salários retroativos.
Muitos estão ligados a setores como o programa de assistência alimentar, escolas de educação infantil e outras instituições financiadas pelo governo federal, como os museus do conjunto Smithsonian. Agências como os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) e os Institutos Nacionais de Saúde (NIH) também afastaram funcionários, o que deve afetar o andamento de pesquisas científicas e experimentos. Embora a maioria das escolas públicas tenham financiamento estadual, o governo federal está por trás de bilhões de dólares em bolsas e empréstimos estudantis, que podem efetivamente ser interrompidos.
Durante a última paralisação, em 2018, parques e florestas nacionais permaneceram abertos, mas com poucos ou nenhum funcionário. Isso levou a casos de vandalismo, bem como acúmulo de lixo nos parques. Também deve haver atrasos em viagens aéreas. Os sistemas de voo podem “ficar mais lentos, reduzindo a eficiência”, alertou um representante da Airlines for America, enquanto agências adiantaram que o processamento de passaportes e outros documentos pode levar mais tempo do que o normal.
Os serviços considerados essenciais, como a proteção de fronteiras e demais funções do Serviço de Imigração e Alfândega (ICE), ou hospitais e controle de tráfego aéreo, continuarão normalmente. No entanto, seus funcionários não terão remuneração por enquanto.
Economia
A escala dos danos econômicos vai depender, em parte, da duração da paralisação – e de sua abrangência. No geral, analistas esperam que esta possa ser maior do que a última, em 2018. Estima-se que o atual shutdown pode reduzir em cerca de 0,1 a 0,2 ponto percentual o crescimento econômico a cada semana – embora grande parte desse valor possa ser recuperada depois que o governo voltar a funcionar normalmente.
O Escritório de Orçamento do Congresso (CBO) estimou que a paralisação de 2018-2019 reduziu a produção econômica em cerca de US$ 11 bilhões, incluindo US$ 3 bilhões que nunca foram recuperados.
A grande diferença, desta vez, é que Trump ameaçou demitir – não apenas afastar temporariamente – alguns trabalhadores, o que tornaria o impacto mais duradouro. Fora isso, o presidente passou os últimos nove meses cortando drasticamente a força de trabalho federal. O contexto também é mais desfavorável, já que estamos falando de uma economia já afetada por turbulências como tarifas e inteligência artificial, com o provável atraso de dados importantes – como o relatório mensal oficial de empregos dos EUA –, o que deve aumentar a incerteza.
“Quando você tem um shutdown, você tem que fazer demissões, então vamos demitir muitas pessoas”, disse Trump na terça-feira, acrescentando: “E elas serão democratas”.
A disputa
Uma reunião na segunda-feira 29 entre o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e os líderes do Partido Democrata no Congresso para negociar a aprovação de uma lei orçamentária que estenderá o financiamento do governo americano não resultou em nenhum avanço.
A briga é a seguinte: os democratas se recusam a apoiar a legislação do Partido Republicano para estender o financiamento até 21 de outubro, a menos que o texto inclua também diversas disposições sobre saúde. Entre elas, estão a extensão dos subsídios que reduzem o custo do seguro saúde sob o Affordable Care Act, prestes a expirar, e uma reversão dos cortes no Medicaid feitos pelo governo atual.
De acordo com líder democrata no Senado, Chuck Schumer, Trump “pareceu, pela primeira vez, entender a magnitude desta crise (de saúde)” depois da reunião de segunda.
Os democratas do Congresso estão sob pressão para usar sua influência para enfrentar Trump e seu governo. Em março, Schumer emprestou votos democratas necessários para aprovar uma medida semelhante de financiamento de curto prazo, redigida pelos republicanos, sem garantir nenhuma concessão – uma medida que enfureceu a base do partido.
O Partido Republicano aprovou o projeto na Câmara no início deste mês, fazendo uso de sua maioria na casa legislativa. Todos os democratas votaram contra, exceto um. No entanto, o texto precisa mais apoio bipartidário para avançar no Senado.
Quando a paralisação terminará é uma incógnita. A última, em 2018, foi a mais longa da história, com 35 dias. Neste caso, tudo depende de quando – ou se – uma das partes chegará a um acordo.
Há duas maneiras principais pelas quais isso pode acabar: ou os republicanos aceitam as demandas dos democratas, ou a paralisação se torna tão perturbadora que os democratas recuam e concordam em financiar o governo – pelo menos temporariamente. Até agora, o governo Trump não tem se mostrado disposto a oferecer concessões e acredita que o Partido Democrata arcará com a culpa pelos distúrbios aos olhos da população.
“Grupos de interesse de extrema esquerda e membros democratas de extrema esquerda queriam se mostrar contra o presidente, e por isso os democratas do Senado sacrificaram o povo americano aos interesses partidários dos democratas”, disse o líder republicano no Senado, John Thune.